IX Dois dias depois da chegada de Henrique, e naquele que se destinara para o passeio à ermida, Cristina foi mais madrugadora do que as aves. À hora a que estas ainda se não agitam nos ninhos, já a prima de Madalena abandonava o leito, receosa de se fazer esperar pelos companheiros da projectada excursão matinal.
Quase não dormira toda a noite aquela rapariga, com tal preocupação.
As estrelas viram-na erguer, e tiveram muito tempo de se despedirem dela, antes de se esconderem discretas ante o aparecimento do dia.
Cristina vestiu-se à pressa e dirigiu-se ao quarto de Madalena.
Esta dormia ainda. O projecto do passeio à ermida não a alvoroçara tanto. Cristina foi acordá-la ao leito.
A Morgadinha abriu os olhos e fitou-os admirada na prima.
- Que queres tu, Cristina? Que lembrança foi essa hoje de andares estremunhando a casa esta noite?
- Levanta-te, preguiçosa, levanta-te. Não o dizia eu ontem? Então são estas as madrugadas que falavas?
- Decerto que não são madrugadas; isto é noite, é o que é.
- Dentro em pouco é dia. Queres ver? E, dizendo isto, Cristina abriu para trás as portas das janelas e correu as cortinas.
A estrela da manhã, Vénus, aquela brilhante e ao mesmo tempo suave estrela, que umas vezes assiste no crepúsculo às melancolias da natureza, outras vezes na aurora ao renascimento dos seus júbilos, cintilava mesmo defronte do leito de Madalena.
- Vês? - disse Cristina.
- Muito pouco. É esse o teu sol? Como vai alto! É pena que não alumie melhor do que esta lamparina.
Cristina sentia redobrar com estas delongas a sua impaciência, quase de criança.
- Anda, Lena, anda. Assim não chegamos a ver do alto da ermida o romper do Sol.
- Pois queres ver isso de lá?! Que crueldade! Em uma manhã de Dezembro!
- Está tão bonita, que parece de Primavera.