VIO leitor, se alguma vez realizou uma viagem na companhia de qualquer amigo, há-de ter observado que, durante os primeiros tempos que passam juntos numa terra para ambos desconhecida, tão alheios às coisas como às pessoas, no meio das quais se vêem, nem por momentos se sofrem separados: um segue sempre o outro em todos os passos que dá, precisa dele para comunicar-lhe as primeiras impressões recebidas, e pedir-lhe em troca as suas; à medida, porém, que, pouco a pouco, se vão familiarizando mais com os lugares e com as personagens daquele mundo novo, afrouxa a constrição desses laços, e cada um principia a readquirir a independência individual, que de moto próprio havia abdicado.
Um facto semelhante nos sucede com Henrique de Souselas.
Encontrámo-lo na estrada; na companhia dele entrámos em uma terra, onde tudo nos era estranho; nada mais natural do que dar o braço um ao outro, passar juntos a manhã, e fazer, em comum, as nossas visitas. Agora, porém, que temos já algum conhecimento da terra e da gente, é tempo de nos declararmos independentes, e sacudirmos o jugo de uma companhia forçada, a qual, embora seja de um amigo estimável, se é forçada, é sempre jugo, em certas ocasiões.
Os próprios Castor e Pólux, ou Pílades e Orestes, penso eu, haviam de ter momentos em que se desejassem sós; se é que não deviam aos deuses a felicidade de possuírem curtos espíritos, o que não creio.
Deixemos, pois, Henrique de Souselas entretendo com a tia Doroteia a mais pacífica das conversas que podem auxiliar a digestão de um jantar; deixemo-lo no tranquilo recinto de Alvapenha, e vamos associar-nos a um dos nossos recentes conhecimentos, que é Augusto, o mestre de Mariana e de Eduardo, aquele pálido rapaz que entrevimos na sala da casa do Mosteiro.