Amando Augusto com sentimento paterno, tinha ambições por o amigo; e, às vezes, movido delas, sentia-se tentado a favorecer aquela paixão; por outro lado, não estimava menos Madalena, e, prevendo as resistências e repugnâncias com que ela teria a lutar, e os tormentos a sofrer, hesitava e desejava poder abafar no coração dos dois os gérmenes de pesares futuros.
Tivemos ocasião de o ver sob estas diversas impressões. Umas vezes repreendendo Augusto, outras quase deixando-lhe entrever esperanças. A chegada de Henrique de Souselas e os sucessos subsequentes despertaram no velho uma espécie de ciúme, e fizeram- -no mais ardente partidário de Augusto.
Tudo isto estava agora transparecendo ao espírito de Augusto.
Beijou as cartas da Morgadinha, releu-as, apertou-as ao coração, e tão enlevado estava pelo perfume do afecto que rescendia de todas, que nem se lembrava já da hora próxima da partida e do motivo que a originara. Motivo que era o desmentido da sua ilusão.
Mas esta ideia amarga acudiu afinal, e a impressão que produziu foi dolorosa; pela primeira vez aquela noite lhe vieram as lágrimas aos olhos e a fronte pendeu-lhe, quase desfalecida, sobre os braços, e assim permaneceu por muito tempo.
Depois levantou a cabeça num ímpeto de desesperação, exclamando: Para que me haviam de vir à mão estas cartas? Que espírito diabólico se compraz de martirizar-me assim? Saber que um anjo me acompanhava com a sua vista protectora, só quando ele me vai deixar para sempre! E dizia ela que me não podia vir o infortúnio daqui!... Não contava com as mudanças do próprio coração.
Na vidraça da sala térrea, em que se achava Augusto, soaram algumas leves e rápidas pancadas que o fizeram estremecer.
- O Cancela já!... É pois certo que vou partir?
Levantou-se para abrir, e os passos vacilavam-lhe como os do condenado ao caminhar para o suplício.