A plateia nunca lhe agradou. Estava mais consigo e com os seus no camarote; e isto de estar consigo e com os seus tinha para ele força de necessidade.
Era costume invariável de Mr. Richard convidar Manuel Quintino, nestas ocasiões.
Grande mortificação causava a este tal convite, mas não se atrevia a recusar. Aceitava e agradecia até; porém, a ocultas, suspirava por ter de privar-se uma noite dos suaves prazeres dos seus serões domésticos, das atenções e cuidados filiais de Cecília e até das monótonas reflexões do amigo José Fortunato; este não sentia menos pesar em modificar hábitos já inveterados nele e prescindir do chá e dos bocejos do vizinho.
Mas não havia remédio. Manuel Quintino ia.
Depois de resolvido a isso, entendia então que tinha restrito dever de chegar a tempo. Era o guarda-livros a pontualidade em pessoa; em tudo observava o preceito de antes esperar do que ser esperado; e, conquanto não fosse provável que esperassem por ele para começar o espectáculo, é certo que, pouco depois de anoitecer, viam-no já a passear no átrio do teatro, aguardando que lhe abrissem as portas dos corredores.
Assim fez esta noite.
Logo que as viu patentes, comprou o libreto da ópera; porque nunca pôde também resignar-se a ouvir cantar, sem entender o que se cantava; subiu para o camarote e, à escassa luz que havia ainda na sala, pôs-se a ler.
Depois assistiu ao acender das serpentinas, à afinação dos instrumentos da orquestra, ao encher gradual da plateia, dos camarotes e das varandas, o que para ele constituía uma parte da diversão e não das menos curiosas. Aguava porém este inofensivo prazer o cuidado que lhe estava dando a demora da família Whitestone; temia já que ela não chegasse ao princípio da ópera. Isto não o deixava sossegar.