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Capítulo 17: XVII - Contas de Carlos com a consciência

Página 198

Em uma palavra, Carlos, que tinha visto frequentes vezes Cecília, ainda que nunca muito atentamente, não pôde, por mais que o tentasse, tirar da memória uma imagem distinta dessa rapariga.

Em compensação, recordava-se do metal de voz sonoro, com que ela lhe falara no baile, da graciosa maneira de rir, de tudo quanto lhe dissera, de todas as pequenas circunstâncias daquela aventura do Carnaval, de todas, e tão profundamente se deixou embeber nestas cogitações que, apoiada a cabeça entre as mãos, os cotovelos sobre a mesa, e os olhos meio fechados, nem se lembrava de Byron, que sinceramente julgava continuar a ler, nem sequer tinha consciência do lugar onde estava.

A luz amortecida difundia no aposento soturna claridade, e o silêncio era tal, que Carlos ouvia-se respirar.

De repente, como que tentando sair daquele estado, afastou de si o livro com vivacidade.

Vergou a cabeça para trás, sobre as costas da cadeira, e passou a mão pelos olhos, à maneira de quem desperta de um sonho. Mas, depois de avivar a luz, caiu de novo na mesma abstracção de que saíra.

Foi, porém, só a mão esquerda que se encostou à cabeça desta vez, enquanto que a direita pegou em uma pena e pôs-se a desenhar e a escrever à toa sobre uma folha de papel branco que lhe estava ao alcance.

Escusado é dizer que a alma não tomava parte nisto.

Segundo a teoria de Xavier de Maistre, la bête ou o outro, que, em nós, devemos distinguir do eu, cansara-se de ler e escrevia agora. A alma, essa, continuava na tarefa anterior, meditava ainda.

Observo, porém, que são perigosas muitas vezes as ocupações a que o tal outro se entrega, quando sacode por momentos o jugo do companheiro. O mesmo Xavier de Maistre aponta-nos exemplos disso.

Uma das distracções mais arriscadas é esta de escrever.

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Capa do livro Uma Família Inglesa
Páginas: 432
Página atual: 198

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Espécie de prólogo, em que se faz uma apresentação ao leitor 1
II - Mais duas apresentações, e acaba o prólogo 11
III - Na Águia de Ouro 21
IV - Um anjo familiar 42
V - Uma manhã de Mr. Richard 53
VI - Ao despertar de Carlos 61
VII - Revista da noite 71
VIII - Na praça 81
IX - No escritório 94
X – Jenny 110
XI – Cecília 119
XII - Outro depoimento 128
XIII - Vida portuense 139
XIV - Iminências de crise 159
XV - Vida inglesa 168
XVI - No teatro 182
XVII - Contas de Carlos com a consciência 197
XVIII - Contas de Jenny com a consciência de Carlos 212
XIX - Agravam-se os sintomas 222
XX - Manuel Quintino procura distracções 236
XXI - O que vale uma resolução 247
XXII - Educação comercial 262
XXIII - Diplomacia do coração 277
XXIV - Em que a senhora Antónia procura encher-se de razão 283
XXV - Tempestade doméstica 290
XXVI - Ineficaz mediação de Jenny 298
XXVII - O motivo mais forte 305
XXVIII - Forma-se a tempestade em outro ponto 312
XXIX - Os amigos de Carlos 326
XXX - Peso que pode ter uma leviandade 344
XXXI - O que se passava em casa de Manuel Quintino 353
XXXII - Os convivas de Mr. Richard 362
XXXIII - Em honra de Jenny 371
XXXIV - Manuel Quintino alucinado 381
XXXVI - A defesa da irmã 397
XXXVII - Como se educa a opinião pública 406
XXXVIII - Justificação de Carlos 412
XXXIX - Coroa-se a obra 422
Conclusão 432