Cecília demorava-se porém pouco tempo junto dela, e pouco tempo em toda a parte. Lembrava uma avezita prisioneira, quando, ao amanhecer de um dia de sol desanuviado, após longos de nuvens e de chuva, bate as asas, salta de poleiro em poleiro, esvoaça de encontro às grades da gaiola, e ensaia de novo o canto, havia muito interrompido.
Ocupada com os preparativos do que ela chamava a festa do pai, Cecília não parava um momento. Descia ao quintal, para colher flores; escondia-se no quarto, para formar ramos, e com eles enfeitar as jarras; passava à sala de Manuel Quintino, para que a ausência não fosse estranhada, e com o fim de dizer ao pai algumas palavras de afecto; depois, voltava ao quintal e sempre com ligeireza e agilidade, próprias daquele corpo flexível e elegante e daquela nervosa compleição.
De quando em quando, chegava também à janela, esperançada em que um feliz acaso lhe satisfizesse não sei bem que secretas aspirações, as quais talvez a leitora adivinhe.
Foi em uma destas ocasiões que Antónia, encontrando-se com ela no corredor, lhe disse à queima-roupa:
– Já esta manhã vi o Sr. Carlos.
Cecília perturbou-se; mas inquiriu, afectando indiferença:
– Aonde?
– Ia a sair de casa. Entrou com uma senhora nova para uma carruagem…
– Havia de ser a Jenny, a irmã…
– Ai, não; não era, não, senhora. Essa tinha saído com o pai, logo pela manhã, que mo disse a Sr.a Josefinha. Esta tal, que eu digo, chegou de fora. Pelos modos… é das tais comediantes do teatro… que ele conhece.
– Comediantes?! – disse Cecília, não procurando já disfarçar a inquietação.
Após este prelúdio, a Sr.a Antónia entrou de alma e coração na matéria, que esgotou completamente. Disse quanto ouviu, quanto viu e, mais ainda, quanto pensou e concluiu de tudo o que ouvira e vira, graças àquele vigor de dedução lógica, que era dos mais característicos dotes desta senhora.