Cecília, conquanto lhe parecessem exageradas as opiniões da criada, sentia que se lhe ia enlutando o coração ao ouvi-la; e que toda aquela disposição para rir e cantar, com que lhe principiara o dia, se lhe estava transformando em irresistível desejo de chorar.
No estio dos nossos climas amanhece às vezes o dia puro e formosíssimo; o céu é azul; resplendentes os raios do Sol; tépida e perfumada a viração, que agita as folhas dos arvoredos; pouco a pouco, parece que o Sol desmaia; que desbota o azul do céu; que nos abafa a atmosfera inflamada; acumulam-se no horizonte, e espalham-se depois por todo o firmamento, nuvens de um azulado de chumbo –; forma-se a trovoada.
Esta manhã de Cecília foi bem semelhante a um destes dias de Verão.
Quando Antónia acabou de expor as conceituosas reflexões a respeito do carácter e vida de Carlos, e de provar à saciedade ser ele possuidor das piores qualidades deste mundo, Cecília separou-se subitamente dela e correu a fechar-se no quarto.
Foi com as faces pálidas e com os olhos vermelhos que ela apareceu diante do pai ao jantar. Contrastava tanto com estes vestígios de tristeza o sorriso a que pretendia obrigar os lábios, que o efeito era mais triste ainda.
Todo se alvoroçou o coração de Manuel Quintino, ao vê-la; tão contente pela manhã, e agora assim! Olhava para a filha, mas não se atrevia a interrogá-la.
Cecília bem fez por se mostrar jovial; falou sempre durante o jantar, mas havia tanto de fictício naquela vivacidade, que ninguém se podia iludir, quanto mais o pai!
Reinou, durante todo o dia, entre Manuel Quintino e a filha aquela espécie de mútua desconfiança, que se dá sempre com duas pessoas, quando há entre elas um segredo, guardado por uma e suspeitado por outra, e no qual ambas evitam falar.