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Capítulo 4: IV - Um anjo familiar

Página 50

– Eu logo vi que me conhecias – dizia Jenny, afastando-lhe compassivamente os cabelos da fronte enrugada. – E hás-de estar quieta, não hás-de?

– Sim, sim – dizia a velha, a rir como criança, e lançava os braços em volta do colo de Jenny, aproximava-a do seio e beijava-a, murmurando com voz chorosa as mais ternas expressões de afecto da língua inglesa.

– Sim, sim, poor thing; sim – repetiu muitas vezes, cingindo-a a cada momento mais a si.

– Ai, miss Jenny, miss Jenny! – dizia a despenseira aterrada.

Jenny fez-lhe sinal com o dedo, a impor-lhe silêncio, ou a mandá-la sair.

A demente, tomando a cabeça de Jenny, principiou a balançar-se como a adormecer crianças, e cantava ao mesmo tempo uma melancólica toada, com a qual, havia cinquenta anos, adormecera já o pequeno Dick, actualmente Mr. Richard Whitestone.

Eis o sentido da canção que, em dialecto escocês, ela cantava:

Dorme, filho, que eu vigio,

E enquanto dormes, sorri;

Que a tua porção de lágrimas

Eu as chorarei por ti.

Jenny não lhe oferecia resistência. A velha chorava, cantando; a voz ia-se-lhe a enfraquecer gradualmente; por fim, tomou-a um daqueles profundos sonos, que parece, nesses estados, participarem já do carácter do sono final, que não vem longe.

Adormeceu entoando em voz já mal percebida:

A tua porção de lágrimas…

Eu as chorarei… por ti…

Jenny desprendeu-se-lhe então dos braços, conchegou-lhe a roupa, fechou a janela e, recomendando silêncio aos criados, desceu.

No fim dos degraus encontrou sentado o jardineiro da casa, com o rosto entre as mãos e soluçando.

– Que é isso, Manuel?

O velho ergueu-se com sobressalto.

– Ai, menina Jenny, é que… veja.

E apontou para o degrau da porta do jardim onde jazia partido um vaso de porcelana com uma preciosa begónia.

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pág. 50 (Capítulo 4)

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Capa do livro Uma Família Inglesa
Páginas: 432
Página atual: 50

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Espécie de prólogo, em que se faz uma apresentação ao leitor 1
II - Mais duas apresentações, e acaba o prólogo 11
III - Na Águia de Ouro 21
IV - Um anjo familiar 42
V - Uma manhã de Mr. Richard 53
VI - Ao despertar de Carlos 61
VII - Revista da noite 71
VIII - Na praça 81
IX - No escritório 94
X – Jenny 110
XI – Cecília 119
XII - Outro depoimento 128
XIII - Vida portuense 139
XIV - Iminências de crise 159
XV - Vida inglesa 168
XVI - No teatro 182
XVII - Contas de Carlos com a consciência 197
XVIII - Contas de Jenny com a consciência de Carlos 212
XIX - Agravam-se os sintomas 222
XX - Manuel Quintino procura distracções 236
XXI - O que vale uma resolução 247
XXII - Educação comercial 262
XXIII - Diplomacia do coração 277
XXIV - Em que a senhora Antónia procura encher-se de razão 283
XXV - Tempestade doméstica 290
XXVI - Ineficaz mediação de Jenny 298
XXVII - O motivo mais forte 305
XXVIII - Forma-se a tempestade em outro ponto 312
XXIX - Os amigos de Carlos 326
XXX - Peso que pode ter uma leviandade 344
XXXI - O que se passava em casa de Manuel Quintino 353
XXXII - Os convivas de Mr. Richard 362
XXXIII - Em honra de Jenny 371
XXXIV - Manuel Quintino alucinado 381
XXXVI - A defesa da irmã 397
XXXVII - Como se educa a opinião pública 406
XXXVIII - Justificação de Carlos 412
XXXIX - Coroa-se a obra 422
Conclusão 432