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Capítulo 1: I - Espécie de prólogo, em que se faz uma apresentação ao leitor

Página 9

Não era mais feliz a prosódia, a alatinada prosódia deste recanto peninsular.

As combinações gramaticais de Mr. Richard, ao falar a nossa língua, saíam marcadas com um verdadeiro cunho britânico. Vénus, a própria Vénus, perderia aquelas ilusões que nos refere o cantor d’Os Lusíadas, se porventura ouvisse o português que ele pronunciava.

Transparecia de alguma sorte nas orações do seu discurso o crédito liberal de um verdadeiro cidadão de Londres. O espírito conciliador e ordeiro, o constitucionalismo arreigado naquele ânimo inglês, e a adesão aos princípios interventores adoptados no seu país, parecia haverem-se estendido, extravagantemente, ao campo da sintaxe portuguesa, levando Mr. Richard, num excesso de tendência harmonizadora, a tentar nela concordâncias de substantivos e adjectivos contra a absoluta e insuperável repugnância de géneros e de números; e a modificar a constituição gramatical de um país aliado, como a Inglaterra gosta de modificar a sua constituição política.

O efeito reunido daquela prosódia e sintaxe era às vezes de uma resultante cómica que não actuava impunemente sobre os ouvidos, aliás não muito pechosos, dos colegas comerciais, em cujos lábios sorrisos de malícia mal disfarçada vinham por instantes afugentar a sisudez da profissão.

Mr. Whitestone percebia-os e bem lhes suspeitava o sentido, mas era completamente indiferente ao que percebia e suspeitava.

Se o contradissessem na pronúncia de uma palavra inglesa, embora das mais controvertidas, se descobrisse um sorriso nos circunstantes, na ocasião em que ele estivesse falando a pátria língua, então sim, então era possível que chegasse a exaltar-se a ponto de quase ameaçar o imprudente com uma irrepreensível aplicação da nobre ciência dos boxers, quase divina arte do soco, que, desde Jack Brougton, tem sido cultivada em Londres «com fanatismo e ensinada com talento» – textuais palavras de escritor ex-professo.

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pág. 9 (Capítulo 1)

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Capa do livro Uma Família Inglesa
Páginas: 432
Página atual: 9

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Espécie de prólogo, em que se faz uma apresentação ao leitor 1
II - Mais duas apresentações, e acaba o prólogo 11
III - Na Águia de Ouro 21
IV - Um anjo familiar 42
V - Uma manhã de Mr. Richard 53
VI - Ao despertar de Carlos 61
VII - Revista da noite 71
VIII - Na praça 81
IX - No escritório 94
X – Jenny 110
XI – Cecília 119
XII - Outro depoimento 128
XIII - Vida portuense 139
XIV - Iminências de crise 159
XV - Vida inglesa 168
XVI - No teatro 182
XVII - Contas de Carlos com a consciência 197
XVIII - Contas de Jenny com a consciência de Carlos 212
XIX - Agravam-se os sintomas 222
XX - Manuel Quintino procura distracções 236
XXI - O que vale uma resolução 247
XXII - Educação comercial 262
XXIII - Diplomacia do coração 277
XXIV - Em que a senhora Antónia procura encher-se de razão 283
XXV - Tempestade doméstica 290
XXVI - Ineficaz mediação de Jenny 298
XXVII - O motivo mais forte 305
XXVIII - Forma-se a tempestade em outro ponto 312
XXIX - Os amigos de Carlos 326
XXX - Peso que pode ter uma leviandade 344
XXXI - O que se passava em casa de Manuel Quintino 353
XXXII - Os convivas de Mr. Richard 362
XXXIII - Em honra de Jenny 371
XXXIV - Manuel Quintino alucinado 381
XXXVI - A defesa da irmã 397
XXXVII - Como se educa a opinião pública 406
XXXVIII - Justificação de Carlos 412
XXXIX - Coroa-se a obra 422
Conclusão 432