Juntar-se-ia aos índios para caçar búfalos pelas cordilheiras perigosas e nas planícies desconhecidas do Far-West; no futuro, voltaria à aldeia, já feito chefe, enfeitado com penas e cores garridas e de cara horrivelmente sarapintada, irrompendo com um arrepiante grito de guerra pela escola de doutrina, numa manhã sonolenta de Verão, fazendo os companheiros empalidecer de inveja. Mas não. Havia outra coisa ainda mais grandiosa do que todas as outras: seria pirata. Isso sim. Via agora o seu futuro claramente e parecia-lhe uma carreira cheia de esplendor. Como o seu nome encheria o Mundo, fazendo tremer os povos! Gloriosamente, iria pilhando todos os barcos pelos mares agitados, no seu barco comprido e negro, O Temporal de bandeira negra ondulada à proa. Quando chegasse ao auge da fama, apareceria de súbito na aldeia, entrando na igreja, de pele tostada, vestido de veludo preto com faixa vermelha e botas altas, de pistolas e alfanje metidos no cinto, chapéu largo enfeitado de plumas, agitando a bandeira negra sobre a qual se distinguissem a caveira e as tíbias. Então, à sua volta, os outros segredariam, num êxtase:
- É Tom Sawyer, o Pirata! O Vingador Negro do Mar das Antilhas!
Sim, estava assente. Era aquela a sua carreira e para a seguir sairia de casa na manhã imediata; portanto tinha de começar quanto antes a preparar-se e a reunir os seus haveres. Encaminhou-se para um tronco meio apodrecido que havia ali perto, e começou, com a sua navalha Barloui a abrir uma cova por baixo de um dos extremos. Em breve se ouviu um som de madeira oca e metendo ali a mão, Tom pronunciou estas palavras, num tom de voz que pretendia ser impressionante:
- O que aqui não veio, que venha! O que aqui está, que fique!
Depois afastou a terra; apareceu-lhe um sarrafo, que puxou, pondo à vista uma caixinha engraçada feita de ripas, dentro da qual estava um berlinde. O espanto de Tom foi enorme. Perplexo, coçou a cabeça, murmurando:
- É incrível!
Depois, despeitado, arremessou o berlinde para longe e ficou a pensar. O facto é que acabara de ver falhar uma superstição que ele e os seus
Companheiros tinham considerado infalível. Pensavam que, se enterrassem um berlinde, murmurando ao mesmo tempo certas palavras necessárias e deixando-o estar enterrado durante quinze dias, quando, ao fim desse tempo, o desenterrassem com as palavras que pronunciara, achariam reunidos todos os berlindes que houvessem perdido, por muito longe que tivessem ficado uns dos outros.