As Aventuras de Tom Sawyer - Cap. 17: Capítulo 17 Pág. 88 / 174

Mas na tarde desse sábado não houve animação na aldeia. Os Harpers e a tia Polly estavam de luto, no meio de um grande desgosto e muitas lágrimas. Uma calma desusada envolvia a aldeia já de si bastante tranquila. Os aldeões faziam o seu trabalho com um ar abstracto e pouco falavam, mas suspiravam muito. O feriado de sábado pareceu às crianças um pesado fardo. Não havia alegria nas suas brincadeiras, que abandonaram pouco a pouco.

À tarde, Becky Thatcher deu por si a passear tristemente pelo pátio da escola e sentiu-se muito melancólica. Não havia ali nada que a confortasse, e, de si para si, disse:

- Se ao menos tivesse outra vez a maçaneta dourada da chaminé! Mas não tenho nenhuma recordação dele...

Pouco depois, parou, sufocando um soluço.

- Foi aqui mesmo! - murmurou. - Se pudesse voltar atrás não repetiria o que disse, não repetiria o que disse por nada deste mundo! Mas agora morreu, e nunca mais, nunca mais o verei!

Este pensamento venceu-a e ela continuou a passear, com as lágrimas a rolarem-lhe pela cara. Então apareceu um grupo de rapazes e raparigas, companheiros de brincadeiras de Tom e de Joe, que ficaram a olhar por cima do ripado e a falar, num tom reverente, na maneira como Tom tinha feito isto e aquilo a última vez que o tinham visto, e como Joe dissera uma ou outra coisa, que lhes parecera insignificante, mas que, afinal, era tão cheia de presságios, como agora se via. Cada um dos que falavam mostrava o sítio exacto onde os pobres rapazes estavam nessa ocasião, e explicava:

- Eu estava mesmo aqui, tal e qual como estou agora, como se tu fosses ele.

Estava assim pertinho e ele sorriu assim e eu senti uma coisa passar por mim. Foi horrível, sabes? Mas nunca percebi o que aquilo queria dizer senão agora.

Depois discutiram quem tinha visto os falecidos pela última vez. Todos queriam pertencer a esse número, davam provas e faziam discursos mais ou menos interrompidos pelos que ouviam; mas, quando se decidiu finalmente quem tinha visto e trocado com os desaparecidos as derradeiras palavras, esses tomaram uma enorme importância e foram invejados pelos outros, que os ouviram de boca aberta. Um pobre pequeno, que não tinha mais nada de que se gabar, disse com certo orgulho:

- Uma vez, Tom Sawyer deu-me uma sova.

Mas esta pretensa glória foi um malogro. Ser sovado por Tom Sawyer não tinha nada de especial, visto que a maior parte dos rapazes da aldeia podia gabar-se disso.





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