A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 29: XXX Pág. 454 / 508

Vendei-vos como cães e ficai-vos com esse remorso; eu não o quero para mim.

E, caminhando para a urna, parou de fronte dela, fitou o Brasileiro, que não pôde sustentar-lhe o olhar com firmeza, e disse-lhe:

- Aí tem o voto do ervanário, Sr. presidente.

O Brasileiro recebeu-lhe a lista, e introduziu-a na urna.

Então o ervanário, cada vez mais ansiado, correu os olhos pela assembleia a procurar alguém; viu o conselheiro, que não ousava aproximar-se, olhou-o algum tempo com uma expressão singular, e no fim estendeu-lhe a mão. O conselheiro apertou-a nas suas, comovido.

- Manuel - disse-lhe o velho em voz sumida - não me cegava tanto o ressentimento, que te negasse esta justiça. Eu era ainda teu amigo.

- E sê-lo-ás sempre, Vicente.

- Sempre que o seja... por pouco tempo será - respondeu o velho, sorrindo tristemente.

- Que dizes?... Mas... que tens tu, Vicente? Que sentes?

- Tio Vicente!... - exclamaram também Augusto, o Morgado das Perdizes, e outros mais.

A fisionomia do ervanário transtornara-se assustadoramente; parecia lutar energicamente para falar ainda, mas a voz embargava-se-lhe na garganta.

- Já não posso... - murmurou ele. - Queria dizer-te... E, apontando para Augusto e olhando para o conselheiro, disse-lhe ainda:

- Era... deste... Ele é... ele está...

Os braços de Augusto, do conselheiro e do Morgado das Perdizes ampararam-lhe o corpo, que ia a cair por terra.

Foi nos braços dos três que expirou o ervanário, porque estava deveras morto, quando o foram a erguer.

O alvoroço foi geral na igreja. Todos a abandonaram, correndo para o adro, para onde foi levado o velho, a ver se era possível reanimá-lo; todos, à excepção do Brasileiro, que ficou a vigiar a urna, e de um agente do Tapadas, que ficou a vigiar o Brasileiro.





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