Manuel Quintino olhava para a criada com gesto desfigurado e a respiração quase suspensa.
– E depois?
– Deu-me uma pancada no coração e fui, pé ante pé, pelas escadas abaixo. Cheguei ao quintal. A menina estava à janela de grades e falava para a rua com alguém. Com medo de ser vista, não pude chegar-me perto e não ouvi o que diziam. Fui dar a volta, pelo lado dos limoeiros, donde podia ouvir melhor, mas, quando cheguei, ia a menina embora. Fui à janela, e lá o vi a ele…
– Mente, mulher! Você tem estado a mentir desalmadamente!
– Ora essa, Sr. Manuel Quintino! Assim Deus salve a minha alma! Isto era lá coisa que eu dissesse, se não fosse verdade?!
Manuel Quintino levantou-se e pôs-se a passear no quarto, com agitação.
– Pois será possível, meu Deus, que assim possa haver maldade no coração de um homem? Carlos! Carlos, a quem eu estimava como filho, a quem eu sempre defendia, quando o acusavam de estouvado! Carlos, que se dizia meu amigo! Que parecia incapaz de uma acção infame!
– Por esse mesmo tempo andava ele de carro com as comediantes…
– Se tudo isto é verdade… então… Oh! Mas Cecília também… Cecília! Ela dissimular, fingir… enganar-me! Ela!…
E o pobre velho quase se sufocava a chorar.
– Custa-me estar a afligi-lo assim, Sr. Manuel Quintino; mas então? que se lhe há-de fazer? – continuava Antónia. – Quando há pouco me disse que a menina tinha ido jantar a casa do inglês… veja lá, sabendo eu o que sabia… veja como devia ficar.
– Jenny foi quem a chamou; junto daquela nada receio por Cecília… De todos posso vir a duvidar – quem sabe o que terei ainda de aprender? – mas de Jenny, dessa!…
– E seria de facto a Sr.a Jenny quem mandou chamar a menina?
Manuel Quintino fitou a criada com olhar fulgurante de indignação.