A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 7: VII Pág. 107 / 508

- Viva a comadre! - disse o João Cancela, continuando a mexer na mala.

Ermelinda foi beijar a mão à madrinha.

Augusto saudou-a afavelmente.

O marido obrigou o corpo a uma meia rotação sobre o alqueire, e, voltando-se para a mulher, disse-lhe, agitando os braços e as mãos, espalmadamente abertas:

- Mulher dos meus pecados, mulher de não sei que diga, olha que a paciência um dia acaba-se, mulher! Isto não pode continuar assim, mulher! Eu não me casei para que tu me andes a ganhar indulgências na igreja, mulher!... Isto são preparos, mulher?... Um homem chega a casa e acha o caldo por fazer, porque a senhora sua esposa deu em ouvir nove missas por dia e uma dúzia de novenas!

- Cala-te, cala-te - retorquiu azedamente a devota metade do Zé P’reira -, cala-te para aí, desalmado. Excomungado seja o mafarrico, que assim me quer atentar logo que entro em casa! Olha lá que não morresses de fome! Estás mal acostumado. Louvado seja Deus! Já não há quem queira sofrer neste mundo mortificações! Cuidas que não tens de sofrer as do Purgatório? E Deus nos queira dar só o Purgatório e livrar-nos das penas do Inferno. Que muito mal fazemos por Lhe merecer misericórdia! Ora que não há-de uma pessoa poder ter as suas devoções, que não venha encontrar lamúrias em casa! Ó minha rica mãe do Céu, seja para desconto dos meus pecados! Sume-te, inimigo mau! E eu que deixei de rezar oito estações, que prometi à Senhora da Rocha, e vai... Ora digam como há-de esta gente cumprir os jejuns que manda a Santa Madre Igreja, se, por duas horas de espera, já se choram todos! Bendito e louvado seja o sacratíssimo coração de Maria!... Ó homem de Deus, e então aqueles santos eremitas, que viviam, no deserto, de raízes e de águas das fontes...

- Que lhes prestasse.





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