- Triste lembrança a nossa ontem de combinarmos este passeio.
Isto é lá coisa que se faça? Vale por uma viagem aos pólos.
Cristina não fazia senão ir do leito de Madalena para a janela e voltar da janela para o leito, em virtude daquela irresistível necessidade de movimento, embora sem ordem nem fim, que experimentamos quando nos deixamos apossar da impaciência.
- Não fazes ideia como está bonito cá fora; nalguns pontos ainda se vê neve.
- Oh que agradável e tentadora beleza! Ainda se vê neve!... Parece-me que já estou gelada... Com esta palavra tiraste-me o alento que ia ganhando. Vês?
- Mas não está frio; até parece que aqueceu o tempo. Então, Lena!... Eles... não tardam por aí. Cuidas que te vai custar muito, e é um engano; aqui estou eu, que não sinto frio nenhum.
- Ora, mas tu estás em condições muito particulares. Quem tem uma fogueira no coração, não precisa...
- Aí principias com as tuas coisas!
- Eu não sei; o que é certo é que esse teu entusiasmo pelos passeios matutinos não é natural. Quantas vezes recusaste acompanhar- me quando eu tos propunha? Ora, se me dás licença, eu explico isso.
- Não quero saber de explicações; veste-te, anda.
- Seja! Infeliz lembrança a deste passeio. E foi daquela tia Vitória, que nem por isso nos quis acompanhar. Não, que já tem juízo; dorme a estas horas o sono da madrugada, que é uma consolação. Que sorte de invejar!
E a Morgadinha, continuando assim a exagerar o sacrifício daquela madrugada e a iludir os motivos secretos a que ela atribuía o ardor e a heroicidade da prima ante os rigores de Dezembro, tudo isto de propósito para a ver impaciente, principiou a vestir-se.
Cristina ficara à janela, espiando os progressos do amanhecer e transmitindo à prima as observações que fazia.