- Quem foi que atirou a pedra? - perguntou um.
- Temos tolice!
- Nada de pedras, olá!
- Então isto é coisa de garotos! Estava a quebrar-se a fúria da onda popular. Os que antes gritavam «morras» achavam já repreensível a primeira tentativa de lapidação. E contudo era a pedra a arma mais pronta para executar a sentença. Era evidente que o maior perigo passara e que um pouco de prudência resolveria a crise.
O pior era que Henrique possuía em pequeno grau essa qualidade, e, irritado pelo insulto, ia cometer talvez um acto irreflectido, apesar dos esforços de Cristina e de Torcato para o reprimirem.
Uma circunstância, porém, veio inesperadamente em auxílio deles e concorreu para dissipar a tempestade.
Foi o caso que, depois de ser posto fora da igreja o Zé P’reira, que, pelas razões que o leitor já sabe e inda mais depois do malogro da interpelação ao missionário, não olhava com bons olhos para este, veio desconsoladamente sentar-se no adro, sobre os degraus de um cruzeiro, tendo ao seu lado o popular tambor, instrumento das suas glórias, e que ainda naquele dia servira à frente da procissão.
Aí se conservou enquanto durou o sermão. Junto do artista deitara- se a dormir o seu satélite, o rapaz do bombo, o que, a pancadas compassadas e valentes, secundava os rufos rápidos e febris que o outro executava na caixa - pancadas que eram, por assim dizer, as vírgulas daqueles floridíssimos períodos acústicos.
Em posição de cansaço e desalento o Zé P’reira monologava, como era hábito seu, sempre que tinha o cérebro repassado do espírito familiar.
Lamentava consigo o bom do homem o desmazelo doméstico da sua cara-metade;