- Por amor de Deus, prima Madalena, que diz essa carta, para assim a perturbar? - perguntou Henrique, já assustado também.
- Não sei bem; não posso ainda dizer a que se refere meu pai; mas sinto-me interiormente sobressaltada, como se o adivinhasse.
- Mas afinal o que se diz aí?
- Leia, e veja se, melhor do que eu, pode compreender esse enigma, por certo doloroso.
Henrique examinou a carta, que a Morgadinha lhe passou para as mãos.
Nesta carta queixava-se o conselheiro à filha de ter sido vítima de um abuso de confiança cometido por alguém, que ele ainda não sabia dizer quem fosse. Num periódico de Lisboa fora publicada por aqueles dias uma carta dirigida tempos antes ao conselheiro por não menor personagem política do que o secretário íntimo do ministro.
O próprio conselheiro confessava ser esta carta demasiado comprometedora, e assim também o demonstrava a excepcional irritação que transparecia em todos os períodos da que escrevera à filha.
O periódico que, para fins políticos, fizera a publicação, havia ocultado os nomes, porém, muitas circunstâncias referidas tornavam inútil a discrição, e em Lisboa ninguém hesitou em apontar os personagens entre quem se passara o facto. Durante uma das suas demoras na aldeia, recebera o conselheiro essa carta; ali, no seio da família, a confiança que depositava em quantos o rodeavam impediu- o de ser previdente, como por hábito o era; fácil foi, portanto, o extravio. O conselheiro dizia à filha que era preciso descobrir o traidor, para evitar futuros abusos; e para isso, que se lembrasse de que o alcance da carta não era para todos compreendê-lo, e, portanto, não se limitassem a indagar entre os da baixa classe. «A vingança - concluía o conselheiro, de uma maneira misteriosa,