Henrique volveu o olhar para o auditório; apiedou-o a consternação daquelas fisionomias. Resolveu valer-lhe.
- Tem a bondade de ver se há alguma carta para mim?
- Ah! Pois já as espera hoje?
- Não é provável; porém... Mestre Bento Pertunhas, em vista disto, começou em voz lenta e fanhosa a leitura dos sobrescritos.
Seguiu-se novo e não menos interessante espectáculo.
A cada nome proferido, erguia-se quase sempre uma voz, às vezes um grito; estendia-se por cima das cabeças um braço, e, podemos acrescentar, ainda que se não visse, alvorotava-se um coração.
Outros, os não nomeados ainda, olhavam com ansiedade para o maço, que diminuía, e cada vez mais se lhes assombrava o semblante.
- Luísa Escolástica, do lugar dos Cojos - lia o mestre Pertunhas.
- Sou eu, senhor, sou eu; ai, o meu rico homem! - exclamou uma mulher jovem, apoderando-se avidamente da carta.
- Joana Pedrosa, de Serzedo - continuava ele.
- Aqui estou; será do meu António, senhor? - disse uma velha pobremente vestida.
- Será do seu António, será - respondeu o insensível funcionário -; o que lhe posso dizer é que traz obreia preta.
A mulher, que já tremia ao receber a carta, deixou-a cair, ouvindo aquelas sinistras palavras. Apanharam-lha, e ela, tomando-a, saiu da loja, a chorar lastimosamente.
- Se foi o filho que lhe morreu, não sei o que há-de ser dela - disse um dos circunstantes.
- Coisas do mundo! - respondeu outro.
Estes comentários foram interrompidos pela continuação da leitura.
- João Carrasqueiro.
- Pronto, senhor - bradou o velho.
- A mesada, hem? - disse Bento Pertunhas, fitando-o por cima dos óculos. - O rapaz não se esquece.
- Deus Nosso Senhor o ajude, que bem bom filho tem sido.
- D. Madalena Adelaide de.