O próprio conselheiro desatou a rir.
O Brasileiro resmungou:
- Então há suborno aos eleitores? Como se entende isto?
- Ora não bula na chaga, senão temos muito que ouvir - disse o Tapadas, e acrescentou: - Ande para diante; deite a sua lista, Sr. Zé.
Os governamentais, que iam de cima, mostraram-se tolerantes, e a lista caiu na urna.
Estava a findar a primeira chamada.
Já se liam os últimos nomes, segundo a ordem alfabética.
A gente de Pinchões, à voz do Sr. Joãozinho, aprontava-se para breve entrar em acção na segunda chamada, que ia principiar.
Faltavam uns doze nomes, quando muito, e dos últimos era o do ervanário, cuja inicial era um V.
Até ali a vitória podia ainda talvez questionar-se, porque a actividade do Tapadas tinha espremido as freguesias que lhe eram afectas, até deitarem o último eleitor: velhos, doentes, mancos e paralíticos foram transportados em cadeiras e em padiolas até à urna para votarem. Mas a freguesia de Pinchões ia abafar a eleição inevitavelmente.
O conselheiro perdeu as esperanças, e o próprio Tapadas sentia- se desfalecer. O Brasileiro estava vermelho e febril de contentamento.
O escrutinador chamou finalmente pelo ervanário.- Vicente Rodrigues da Fregosa, disse ele, preparando-se já para voltar o caderno.
- Adiante. Esse vai votar a uma assembleia mais longe - disseram alguns.
E ia-se proceder a segunda chamada, quando se ouviu do fundo da igreja uma voz trémula, mas sonora ainda, responder:
- Presente!
Voltaram-se todos ao escutar aquela palavra.
Adiantava-se lentamente, pálido, curvado, acabrunhado como nunca, o velho ervanário, a quem o braço de Augusto servia de apoio.
Dir-se-ia um cadáver ressuscitado do túmulo.
Com as faces pálidas, o olhar amortecido, os passos incertos, o ervanário adiantava-se e trazia já de longe o braço estendido, segurando a lista que vinha lançar na urna.