- Esse pensamento é linguareiro; ficamos todos sabendo aquilo em que tens estado a cismar.
Cristina corou intensamente, ao perceber o sentido das palavras do conselheiro, e tentou defender-se, dizendo:
- Ora, não era isso, tio. Eu perguntava, porque...
- Sossega; quando o véu estiver pronto, a laranjeira não nos faltará com ramos e flores.
- Não, mano - disse D. Vitória - olhe que se não trata de ver o que é que está dando nas laranjeiras, dentro em pouco não há uma só na quinta. Que também para serem comidas as laranjas pelos criados... Porque quase que são só para eles. Não que não faz ideia!...
E continuou com D. Doroteia a narração dos abusos de que os criados eram culpados.
Daí a momentos foi o conselheiro o primeiro a falar.
- Esta é galante! - disse ele, examinando uns papéis e rindo.
- Ora ouça isto, Henrique. Aqui está um homem que deseja que eu empregue nada menos do que sete sobrinhos que tem. Sete! É uma geração como a de Jacob; se estivéssemos na corte de Faraó!...
- Se se satisfizessem cada um com uma pasta?... Era um ministério completo - disse Henrique.
- Oh! oh! - dizia o conselheiro, passados alguns momentos. - Cá está o meu amigo Pertunhas, teimando com o lugar de recebedor.
- Pois o maroto inda se atreve?...
- E que despesa de estilo que faz! É uma ode congratulatória em prosa.
Nestas entremeadas conversas e diálogos curtos e interrompidos passou-se o tempo até à chegada do correio, sucesso que marca época numa manhã passada na aldeia.
Naquele dia, sobretudo, eram esperadas com ânsia as cartas e os periódicos, que deviam trazer notícias do resultado das eleições dos diferentes círculos do país.
O conselheiro já por três vezes consultara o relógio, estranhando que o correio se demorasse.