– Até que soou a hora da redenção! – exclamou ele, pondo o chapéu na cabeça.
– Então já se vai embora? – disse Manuel Quintino, maliciosamente.
– E acha você que não tomei dose bastante de comércio esta manhã? Isto em pleno Carnaval? Que impiedade!
– Eh! eh! eh! E que me diz do tal negócio da aguardente? Então com que está alto o juro, hem? Eh! eh! eh!
– Vi-me deveras embaraçado com a tal aguardente!
– Mas saiu-se bem.
– Agradeço-lhe o auxílio.
– Quer mandar dizer alguma coisa ao correspondente a tal respeito?
– Que vá para o diabo! Não me pôde ocorrer o arrevesado nome desse maldito. Como se chama ele?
– Então não sabe ainda? Woodfall Hope… Uma das primeiras firmas comerciais de Londres; e neste negócio da aguardente…
– Não, isso mais devagar, Manuel Quintino – atalhou Carlos –; não lhe aturo nem mais uma palavra a respeito do tal negócio da aguardente. Boas tardes. Adeus, meus senhores. Deixem isso e vão ver as máscaras. Adeus.
– Farwell! Mr. Charles… Eh! eh! eh!…
Dentro em pouco, ouvia-se o descer apressado de Carlos, e a pancada violenta da meia cancela do portal impelida de encontro ao batente.
O escritório voltou ao primeiro silêncio. A Praça estava quase deserta. Como era terça-feira de Carnaval, terminara mais cedo a azáfama do comércio. Os caixeiros bocejavam e o chiar da pena de Manuel Quintino aumentava o efeito sonífero do lugar.
De repente, porém, foi mais ruidosamente interrompido o silêncio por o «Trai larai, larai, larai, lai» do guarda-livros.
O bom homem, revendo o trabalho feito, descobriu omissões e enganos que o obrigavam a refazê-lo outra vez; a isto procedeu com exemplaríssima paciência.
Voltou a si todas as culpas.
– Ora eu devia ter mais juízo. Ainda me deixo distrair como as crianças; merecia palmatoadas.