Uma Família Inglesa - Cap. 10: X – Jenny Pág. 114 / 432

assim?

Pressentimentos! Que espírito filosófico há aí que os admita?

Jenny era ainda uma criança, quando perdeu a mãe; no meio dos jogos e dos brinquedos infantis veio um dia surpreendê-la este profundo golpe no coração; ao seu lado, crescera o mal ameaçador e terrível, mas, no descuido de tão tenros anos, só dera por ele quando a vítima lhe caía prostrada nos braços. Feliz idade, a destas imprevidências! Num momento a vida inteira se lhe afeiçoou muito diversa do como até então a antevira. Cedo, muito cedo, aquela criança franzina e débil recebeu a solene investidura da sacrossanta missão de mulher; transmitiu-lha a mãe, já moribunda; legou-lhe, nos derradeiros instantes, a tarefa abençoada, que até o fim cumprira, sem um só dia de desalento.

Apertando nas mãos já frias as da filha lacrimosa, que só então vira a morte, que, tanto havia, a ameaçava nos seus mais queridos afectos, incumbiu àqueles poucos anos o pesado encargo da família; e, com a voz trémula e os olhos turvados pelas sombras do adormecer final, disse-lhe que a essas mãos ia deixar entregue a paz da vida interior, a felicidade dos seus; que a elas confiava os tesouros e bálsamos de afeições e de carinhos, com que, no lar doméstico, se sanam tantas dores e desilusões, colhidas lá fora, nas lutas da sociedade; depois, cingindo ao peito a filha, como em extrema recomendação, para a qual as palavras lhe faltavam já, morreu beijando-a; ungiu-a de suas últimas lágrimas e impressionou-lhe a mente infantil a ponto que a órfã, depois de a chorar sobre o túmulo, levantou-se mulher, mulher apesar dos seus doze anos, mulher pela sisudez dos pensamentos, pela consciência viva e fervente da sua nova missão.

É um ensino eficaz o do infortúnio! Desde essa hora fatal, como que se abriram os olhos de Jenny para verem mais fundo no coração daqueles que era dever seu tornar felizes.





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