Uma Família Inglesa - Cap. 11: XI – Cecília Pág. 125 / 432

que ela não reprimiu, acrescentou: – E então, naquela idade e naquela miséria toda, o cuidado que o pobrezinho tinha ainda com o rabicho que usava na cabeleira! Coitado!

De outra vez contava, rindo, o episódio caricato de certo operário, seu vizinho, que voltara uma noite a casa em completo estado de embriaguez, e atordoara a rua inteira com expansões de extemporânea alacridade, altercando, cantando e tocando até altas horas. Tudo quanto até ali referira lhe merecera sorrisos, mas, num instante, cobriu-se-lhe o rosto de profunda tristeza e, suspirando, prosseguiu, cingindo a mão de Jenny:

– Mas não quer saber? Quando este homem estava mais contente, vieram trazer-lhe um cão, que ele estimava muito e que naquela mesma noite haviam envenenado nas ruas. Parece-me que estou ainda a ver como ele ficou; esteve por muito tempo calado a olhar para o pobre animal e depois desatou a chorar e a abraçá-lo, chamando-lhe seu amigo, seu companheiro, até… – acrescentou, sorrindo – até seu irmão. Metia realmente dó. E aquela gente a rir cada vez mais! Era aquilo para rir; diga?

Justeza de observação, talento para apreciar todas as faces dos sentimentos e das acções humanas, poucas vezes os dá o estudo no grau em que ela naturalmente os possuía.

Não se podia pois, repetimos, dizer Cecília apaixonada como uma italiana, pensativa como uma alemã, séria como uma inglesa, lânguida como uma espanhola, coquette como uma francesa, porque a nenhum desses tipos se aproximava; era verdadeiramente portuguesa, e, para caracterizar estes, só conheço uma frase, de que talvez o leitor se vá rir, mas pela qual eu tenho inexplicável predilecção. Associa-lhe o meu pensamento tal conjunto de qualidades físicas e morais que, sempre que a ouço aplicar, ela só, supre para mim uma longa descrição; e se for a analisá-la não lhe encontro decerto a compreensão que instintivamente lhe atribuo.





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