Uma Família Inglesa - Cap. 2: II - Mais duas apresentações, e acaba o prólogo Pág. 14 / 432

O vê-las luzir eleva o pensamento a meditar coisas do céu.

Há entes assim que tudo santificam; paixões, que nuns acalentam vícios, são neles eficazes impulsos para sublimes virtudes.

O cálice, que, em mãos profanas, preside aos banquetes e às orgias, consagrado no altar, transforma-se em símbolo misterioso da mais augusta religião.

Deus desce também a muitas almas, para tornar em holocausto digno de si as paixões originárias delas.

Carlos era, sob muitos respeitos, diferente da irmã.

Inglês pelo sangue, meridional pelo clima, onde vira, a primeira vez, a luz do dia, onde passara a infância, onde sentira as primeiras comoções da adolescência, o despertar da vida do coração, tinha um carácter que se ressentia desta, de alguma sorte, dupla nacionalidade.

Da Península recebera o entusiasmo, a viveza de imaginação, a impetuosidade de sentimentos, que raras vezes reprimia; vinham-lhe da Grã-Bretanha a força de vontade, a pertinácia, o estoicismo, com que, em certas ocasiões, surpreendia a quantos julgavam conhecê-lo; vinham-lhe até, da mesma fonte, algumas excentricidades de manifesta herança paterna – eficaz inoculação de britanismo, que não lhe consentiria mentir à origem, se alguma vez o tentasse.

Ainda que algum tanto estouvado, não deixava por isso Carlos de possuir um generoso e compassivo coração, alma sensível a todos os infortúnios, olhos a que a piedade não permitia serem estranhas as lágrimas.

Se, por acções mal refreadas, por palavras irreflectidas, as fazia também verter, era ele o primeiro a acusar-se, a compadecer-se, a procurar enxugá-las por toda a qualidade de sacrifícios.

Capaz de heróica abnegação em bem dos outros, se frequentemente se esquecia de benefícios recebidos, como se poderia censurá-lo,





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