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Capítulo 13: XIII - Vida portuense

Página 147
que, havia muito tempo, ganhara o hábito de vir todas as noites ali ouvir ler os jornais, tomar chá e sustentar com o guarda-livros o mais soporífero e descosido diálogo que se pode conceber, retirando-se enfim, ao bater das nove horas, depois de agasalhar o pescoço com uma manta de lã, a qual levava sempre de prevenção para toda a parte. Chamava-se José Fortunato; fora em tempo negociante de cereais; nesta época era proprietário de prédios velhos, possuidor de papéis de crédito, homem de hábitos pacíficos e ideias conservadoras, modesto no vestir, discreto no falar, fazendo ao jantar o seu forte no cozido, e, entre as maiores extravagâncias da sua vida actual, contando a de comprar, de quando em quando, uma lagosta para comer de salada.

Era destes sujeitos fiéis observadores das leis comerciais e rigorosos nas suas contas, a ponto de poderem parodiar uma das petições do Padre-Nosso, dizendo: – Fazei que nos paguem, Senhor, as nossas dívidas, assim como nós pagamos aos nossos credores.

Esta quotidiana visita a Manuel Quintino tornara-se já para o Sr. Fortunato uma necessidade, e de igual forma a presença e o conversar do ex-negociante de cereais, conquanto pouco férteis em distracções, não eram menos precisas ao pai de Cecília, que estava naquela idade em que os hábitos imperam com mais força e menos se amoldam os génios às exigências de hábitos novos.

Passados os cumprimentos de tarifa, José Fortunato tomava assento ao lado de Manuel Quintino, e principiava entre eles um diálogo, que, com as variantes que o leitor prevê, era deste teor e forma:

– Muito frio, Sr. Fortunato – dizia um.

– E muita chuva – respondia o outro, ajeitando-se. – Esteve hoje lá em baixo?

Pergunta ociosa.

– Estive.

– Então que se diz de novo?

– Nada.

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pág. 147 (Capítulo 13)

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Capa do livro Uma Família Inglesa
Páginas: 432
Página atual: 147

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
I - Espécie de prólogo, em que se faz uma apresentação ao leitor 1
II - Mais duas apresentações, e acaba o prólogo 11
III - Na Águia de Ouro 21
IV - Um anjo familiar 42
V - Uma manhã de Mr. Richard 53
VI - Ao despertar de Carlos 61
VII - Revista da noite 71
VIII - Na praça 81
IX - No escritório 94
X – Jenny 110
XI – Cecília 119
XII - Outro depoimento 128
XIII - Vida portuense 139
XIV - Iminências de crise 159
XV - Vida inglesa 168
XVI - No teatro 182
XVII - Contas de Carlos com a consciência 197
XVIII - Contas de Jenny com a consciência de Carlos 212
XIX - Agravam-se os sintomas 222
XX - Manuel Quintino procura distracções 236
XXI - O que vale uma resolução 247
XXII - Educação comercial 262
XXIII - Diplomacia do coração 277
XXIV - Em que a senhora Antónia procura encher-se de razão 283
XXV - Tempestade doméstica 290
XXVI - Ineficaz mediação de Jenny 298
XXVII - O motivo mais forte 305
XXVIII - Forma-se a tempestade em outro ponto 312
XXIX - Os amigos de Carlos 326
XXX - Peso que pode ter uma leviandade 344
XXXI - O que se passava em casa de Manuel Quintino 353
XXXII - Os convivas de Mr. Richard 362
XXXIII - Em honra de Jenny 371
XXXIV - Manuel Quintino alucinado 381
XXXVI - A defesa da irmã 397
XXXVII - Como se educa a opinião pública 406
XXXVIII - Justificação de Carlos 412
XXXIX - Coroa-se a obra 422
Conclusão 432