Whitestone estava distraído; mas não há distracção possível que impeça um inglês de corrigir qualquer inexactidão que, embora leve, toque pela sua nacionalidade; por isso interrompeu imediatamente a narrativa de Manuel Quintino, emendando-a.
– Ho! Não, não. De Espanha! Ho! Da Escócia, da Escócia. In the Lothian county. The bride of Lammermoor, de Sir Walter Scott. É bem conhecido isso.
– Ai, é verdade, é da Escócia, é. Já me não lembrava. Pois este fidalgo, ao que parece, tinha lá umas birras com outro seu vizinho, também muito nobre, é verdade, mas sem nada de seu. Eram rixas velhas e até me parece que uma demanda dos meus pecados! Vai logo o… o S. Pedro e faz com que este tal se enamore da irmã do outro. Que isto acontece muitas vezes.
Nesse ponto foi o pano acima.
Manuel Quintino, depois de exame passado à cena, prosseguiu:
– Estes homens de saias, que aí estão, são os criados do tal fidalgo. Andam à cata do amante, que vinha falar com a rapariga ao jardim.
O argumento exposto por Manuel Quintino prosseguiu por este teor e estilo, sem que Mr. Richard nem Jenny lhe dessem atenção.
Depois da chegada do barítono e durante o recitativo deste, ia Manuel Quintino vertendo em vernáculo as frases italianas que percebia, por conseguinte aquelas que menos precisavam de ser vertidas.
«Mortal nemico» – recitava no palco o barítono. – «Mortal inimigo» – traduzia o velho, do camarote. – «Di mia prosapia» – dizia um. – «Ele mesmo confessa que tem prosápia» – interpretava, e desta vez desastradamente, o outro. – «Io fremo!» – acrescentava daí a pouco tempo o cantor. – «Diz que treme», traduzia Manuel Quintino.
E assim por diante, até que Mr. Richard, ao principiar no palco a ária:
Cruda… funesta smania
pôs termo com ligeiro psiu aos luminosíssimos esclarecimentos do guarda-livros.