– E tingiu-se; sim – disse Carlos –, e feitos todos estes aprestos, caminhou para a entrevista.
– E como se realizava essa entrevista? – perguntou um militar.
– De uma maneira muito singular – prosseguiu Carlos – o conselheiro, todas as noites, depois de pousar na relva o chapéu, a bengala e as luvas, trepava, como um esquilo, pela faia que fica junto da varanda e…
– Ora! Impossível! – exclamaram alguns, rindo.
– Palavra!
– Isso é contra todas as leis da mecânica, aquele bojo… – principiou a dizer um estudante da Universidade.
– Pelo contrário – atalhou outro – é exactamente o bojo que o faz subir. Lembra-te do princípio de Arquimedes. Os aeróstatos…
– A queda do conselheiro seria uma bela experiência para um curso de física…
– Divertida… – anotou uma voz.
– Como exemplificando as leis da queda dos graves… um tão grave personagem – concluiu o primeiro.
Estes sujeitos guindavam o calembour ao supremo grau da escala do espírito.
– Então? deixem falar Carlos; e depois? – disseram alguns curiosos.
Carlos continuou:
– Naquela noite, porém, estava reservada ao conselheiro a mais triste surpresa; ao entrar na espessura da folhagem, deu de cara com o outro.
– Com o Vítor?
– Exactamente, com o Vítor. Imaginem agora vocês o soberbo diálogo que se seguiu ao encontro.
– Devia ser preciosíssimo! Que harmonioso certame de rouxinóis!
– O conselheiro principiou talvez por dizer-lhe:
Tytire, tu patulæ recubans sub tegmine fagi
Formosam resonare doces Amaryllida silvas
– Protesto contra o recubans. A posição de Vítor era menos cómoda.
– Mutatis mutandis, já se sabe.
– Ó padre Manuel, diz-nos como a tua latinidade exprimiria a posição em que estava o Vítor.
– Não interrogues o padre. Não vês que ele está, como os antigos agoureiros, consultando as entranhas das aves? Respeitemos a solenidade do acto.