– E para quê? – pensava ele – ninguém já agora arrebatará esta presa à morte. Pelo menos que seja tranquilo o passamento. Deixá-la morrer em paz.
E ficou, ficou ele só, único espectador daquela cena lúgubre, daquele espectáculo pouco talhado para a sua juventude, para a sua índole e para os vestidos de gala, com que, para bem outros fins, esmeradamente se preparara.
Era notável o contraste. A velha caiu em silêncio profundo, apenas cortado de surdos gemidos.
Dava meia-noite, quando uma respiração mais ampla, após um profundo repouso, fechou o círculo daquela longa existência.
Carlos conheceu que tinha diante de si um cadáver.
Depois de por algum tempo a encarar melancolicamente, desceu-lhe, com piedoso respeito, as pálpebras sobre os olhos amortecidos.
Foi neste piedoso mister que o vieram encontrar Jenny e Mr. Richard. Voltando da visita a Mr. Smithfield e sua filha, souberam no portal que Carlos não havia saído, em consequência do violento acesso que acometera Kate.
Aí mesmo se desvaneceu toda a irritação de ânimo em Mr. Richard.
– Então não saiu?
– Não, senhor – disse o criado –, havia-se vestido para sair, mas até agora tem estado só no quarto da Sr.a Catarina.
O velho inglês, que tinha ainda pela que fora sua ama uma verdadeira afeição, sentiu-se comovido ao ouvir isto.
Ele e Jenny correram então ao aposento de Kate.
– Expirou agora – disse Carlos, ao vê-los entrar.
O pai e a filha acercaram-se apiedados do leito.
Jenny não recusou lágrimas de saudade àquela velha mulher, que ela, tão longe quanto lhe ia pelo passado a memória, se recordava de ver sempre junto de si.
Mr. Richard curvou também a cabeça perante aquele tão solene espectáculo.
Carlos ficava-lhe defronte e ao lado a irmã.
Jenny, enxugando os olhos, voltou-se para ele.