Carlos, ao sair do portal, pensava:
– Despeitos! Será por eu não ter vindo ontem? Deus o queira; tudo se explicará em meu abono e depois o direito a uma compensação será óptimo advogado na minha causa. A indiferença era pior.
Dali foi Carlos para o escritório, onde deu a Manuel Quintino os parabéns, pelo seu restabelecimento.
– Sinto – acrescentou – não ter podido ontem festejar, como tencionava, o seu último dia de doença, mas o que houve lá em casa…
Já sabe?
– Já sei – respondeu Manuel Quintino, que se mostrava algum tanto embaraçado.
– Esta manhã ia com tenção de saber de si – continuou Carlos. – Vendo todas as janelas fechadas, receei que se tivesse sentido pior. Soube, porém, que era sua filha que se achava incomodada.
– Cecília?! – exclamou Manuel Quintino, já assustado.
– Sossegue – respondeu Carlos, sorrindo, porque o espanto de Manuel Quintino acabava de confirmar as suspeitas que tivera. – Pela maneira por que me falou a criada, imagino que não é de gravidade o incómodo. Nem tempo tive de averiguar disso, tal foi a pressa com que ela me fechou a porta. A boa mulher parecia ter medo de mim. Falou-me com um arreganho!
Manuel Quintino fez que sorria; mas era evidente que alguma coisa lhe pesava no coração.
Depois de curta hesitação, aproximou-se de Carlos, e ainda com modo constrangido, disse-lhe, chamando-o de parte:
– Senhor Carlos, eu tenho-o por um homem de bem; por isso prefiro falar-lhe com franqueza a andar com jogo encoberto, que nem é para o meu génio, nem para o seu.
Carlos ficou surpreendido com aquelas palavras, tão inesperadas como misteriosas.
– Então que temos, Manuel Quintino? Fale. Parecem comunicações graves as que tem para me fazer – dizia ele, olhando-o interrogadoramente.