Eu creio que nem a filosofia e o landwehr da Alemanha; nem o knout e sombria política da Rússia; nem os fuzilamentos e o militarismo da Espanha; nem os meetings e os fenians da Inglaterra; nem o sufrágio universal e a febre napoleónica da França têm conseguido tornar as respectivas nações mais avessas ao canto do que a nossa. Com o nosso céu, com a nossa vegetação, com os nossos vinhos e com a nossa língua e com tão pouca disposição para nos ocuparmos de coisas sérias – e nesse particular nenhum povo nos leva a palma – esta quase aversão que temos ao canto denota uma índole essencialmente sisuda e pouco de gente do meio-dia.
Em qualquer jantar nacional, qual seria o conviva que teria coragem para imitar Mr. Brains, satisfazendo ao pedido do seu anfitrião e dispondo-se a cantar?
E, se algum houvesse, com que olhos de escandalizados o não encarariam os outros?
Ninguém há mais pusilânime diante do ridículo do que o português; ninguém que mais corajosamente o encare de face do que o cidadão britânico. Ora o ridículo imita os costumes insidiosos de certos cães, que mordem as pessoas que lhes fogem, e recuam diante de quem os espera a pé firme.
O que é verdade é que Mr. Brains, vergando-se sobre as costas da cadeira, com as pernas estendidas, os olhos meio fechados, a mão pousada sobre o corpo, principiou a cantar com voz de impossível classificação, em timbre nasal, e em música inglesmente monótona, uma canção de Sharpe feita para ocasiões como esta.
O sentido era pouco mais ou menos este:
Vá! sem medo enchei os copos
De vinho, cor de rubim;
Levem-no aos lábios as damas;
Consagrá-lo-ão assim.
No peito o vinho alimenta
Da amizade o almo calor,
E o engenho dele regado,
Ascende em voo maior.
Enchei os copos, fiai-vos
Nesta bebida de reis
Contanto que…
Estava escrito que os dotes vocais e os talentos artísticos de Mr.