A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 19: XIX Pág. 297 / 508

Henrique estava sendo desagradavelmente impressionado por o que via.

Olhava com desgosto para aqueles sinais de um terror supersticioso, e sentia exacerbarem-se-lhe as prevenções que nutria contra o clero, cuja influência moral, aliás justa e vantajosa, é cada vez mais diminuída por aqueles dos seus membros que pretendem aumentá-la por meios impróprios da sublimidade da sua missão e até dos preceitos da religião, de que se dizem ministros.

Henrique fez algumas reflexões neste mesmo sentido a Madalena, que não pôde deixar de apoiá-las, tanto mais que sabia o ânimo de Cristina, que os escutava, não de todo superior a este aparato terrorífico.

A hora marcada para o sermão aproximava-se; haviam-se já evacuado os diferentes confessionários, e o povo cada vez se apertava mais em todos os pontos da igreja e trasbordava para fora das portas do templo. Quem de dentro olhasse para a porta principal veria que a grande distância, na rua, se prolongava a multidão.

Apenas um confessionário permanecia ainda ocupado. Havia mais de uma hora que ali estacionava de joelhos uma penitente com a cabeça coberta por a capa de pano, com que rodeava o crivo da confissão.

Nem o menor movimento revelava animação naquele vulto.

Henrique notara essa imobilidade, que ao princípio o fez sorrir; depois causou-lhe espanto e acabou, enfim, por o indignar. Qual, porém, não foi a sua surpresa e a de Madalena, quando, ao terminar a confissão, reconheceram as feições da penitente por as de Ermelinda, a filha de Herodes, a formosa e amorável criança, que, dias antes, tanto entusiasmo causara, agora pálida, abatida, sem aqueles sorrisos nos lábios, que tanta graça lhe davam! E era esta criança que tão longos pecados tinha a narrar, para assim ficar





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