Os circunstantes quase faziam já coro com as arguições do Cancela contra os excessos do fanatismo e do beatério.
- A falar a verdade - dizia um - este pobre homem tem alguma razão. Isto de meter cismas às crianças!...
- E a Rosita do Gaudêncio olha que vai por a mesma.
- Também é de mais.
- Eu por mim se fosse a ele... Não sei o que faria.
Nestes e noutros dizeres se iam retirando do cemitério.
Não seria difícil a um espectador aproveitar aqueles mesmos braços e armas para organizar uma sedição sobre uma divisa oposta à que primeiro os convocara.
Ao ver cerrar-se a campa sobre o corpo da filha, o Cancela caiu de joelhos, sufocado em pranto.
As crianças presentes, por o contágio da comoção, a que é tão sujeita aquela idade, choraram também.
Madalena ia a consolá-lo, mas o sentimento próprio não a deixou falar.
Só pôde pousar-lhe em silêncio a mão no ombro.
O Cancela apoderou-se dela, e, levando-a aos lábios, rompeu em mais desafogado pranto do que nunca.
A noite crescia; cada vez era mais cerrado de nuvens o firmamento.
Os sons das Ave-Marias vibraram nos ares, prolongados e tristes. O padre velho pronunciou em voz alta a saudação angelical. Responderam-lhe as crianças.
Tudo concorria para aumentar a extrema melancolia do quadro.
O Cancela a muito custo se resignou a arrancar-se dali.
A Morgadinha voltou a casa com o coração opresso de tristeza.