A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 26: XXVI Pág. 398 / 508

Sem uma exclamação, sem uma palavra de desespero ou de susto, sem nem ao menos erguer o tom de voz, ou modificar a inflexão afável, que lhe era natural, preparou um quarto para Henrique e nele todos os aprestes que o seu grave estado pedia, dirigiu os primeiros socorros com inteligência e eficácia, mandou chamar o cirurgião, enviou a Alvapenha parte do sucedido, e ordenou que procurassem Madalena, ocupando nisto a menor gente possível, e deixando a outra toda como alimento à impaciência de sua mãe.

A índole de Cristina tinha destas energias essencialmente feminis e simpáticas. Não era para o salão que se formara e educara o ingénuo e meigo carácter da prima de Madalena. Aí tomava-a um acanhamento, que já não conseguiria vencer, mas nas lides domésticas, na vida do lar era dessas corajosas lutadoras, a quem a desventura não derruba, cuja inteligência por tudo se reparte; destes génios providenciais, que pairam sobre o estreito horizonte da família, activos, laboriosos, achando nas fadigas um prazer; nos sacrifícios, estímulos para mais amar; nos sorrisos que provocam, nas dores que aliviam, nas lágrimas que enxugam, prémio bastante para compensar as penas que sofreram.

Mulheres são estas nascidas para serem esposas e mães, o que é quase o mesmo que dizer: nascidas para serem mulheres.

A chegada de D. Doroteia, que acudiu apressada logo que soube o que sucedera ao sobrinho, não dispensou Cristina destes cuidados, que voluntariamente tomara.

Conquanto a senhora de Alvapenha fosse mais razoável do que D. Vitória, e de temperamento menos susceptível daquelas inúteis efervescências, em que esta se deixava arrebatar, não era também mulher para casos destes.

Na sua longa vida de celibatária sem família, D. Doroteia perdera ou embotara a faculdade preciosa de acertar bom caminho em qualquer imprevista ocorrência.





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