As Aventuras de Tom Sawyer - Cap. 21: Capítulo 21 Pág. 105 / 174

Filas de rapazes pequenos, lavados e vestidos do modo mais desconfortável possível; filas de rapazes crescidos e desajeitados. Frisos de raparigas de várias idades vestidas de cambraia ou de musselina, muito vaidosas dos seus braços nus, das jóias das avós, dos laços de fita azul e cor-de-rosa e das flores que tinham no cabelo. O resto da casa estava ocupado pelos estudantes que não tomavam parte na festa.

Começaram os exercícios. Um rapazinho muito pequeno levantou-se deveras acanhado e recitou: «Mal se pode esperar de uma pessoa da minha idade que fale em público, num palco», etc. - acompanhando-se com uns gestos difíceis e desastrados, que lembravam os movimentos duma máquina escangalhada. Lá chegou ao fim sem se perder, embora cheio de medo, e teve uma salva de palmas quando acabou de fazer a sua reverência e voltou a sentar-se.

Uma rapariga muito envergonhada tartamudeou: «Mary tinha um cordeirinho», etc., curvou-se numa cortesia que fazia dó, recebeu o seu merecido quinhão de aplausos e sentou-se, corada e contente.

Tom Sawyer adiantou-se, afectando uma grande serenidade, e começou com enorme fúria de gestos o inextinguível discurso: «Dai-me liberdade ou antes a morte», mas parou no meio. Apossou-se dele o pavor do palco, tremeram-lhe as pernas e parecia-lhe que ia sufocar. A verdade é que toda a assistência teve pena dele, mas ficou em silêncio, o que era o pior de tudo. O mestre franziu o sobrolho, e o desastre foi completo.

Tom lutou para se dominar, mas, por fim, retirou-se, completamente derrotado. Houve uma fraca tentativa de aplausos, que se extinguiram logo.

Seguiu-se «O Rapaz do Convés em Chamas», «A Descida do Assírio» e outras jóias de declamação. Então, houve exercícios de leitura e provas de ortografia. A escassa classe de Latim fez o que lhe competia. Foi então a vez do melhor número da noite, que eram as composições originais das alunas. Cada uma por sua vez caminhava até à beira do estrado, apurava a voz, abria o seu manuscrito - que vinha atado com uma fita - e começava a ler, apurando-se muito na «expressão» e na «pontuação». Os assuntos eram os mesmos que já tinham sido tratados noutros tempos pelas mães, pelas avós e, sem dúvida, por todas as suas antepassadas desde a época das cruzadas: «A Amizade»; «Lembranças de Outrora»; «A Religião na História»; «A Terra dos Sonhos»; «As Vantagens da Cultura»; «Contrastes e Comparações entre Formas de Governo»; «Amor Filial»; «Anseios do Coração»; «A Melancolia», etc.





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