A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 7: VII Pág. 109 / 508

..

- Compadre! - atalhou escandalizada a Sr.ª Cat’rina - compadre! É essa a educação que dá à sua filha? São coisas que se digam diante de uma criança de doze anos? Ande lá, ande lá... Ora Deus queira que lhe não encontre ainda o pago. Era bem melhor que lhe ensinasse, ou mandasse ensinar, a doutrina; que é mesmo uma vergonha o pouco que sabe dela.

- Bem tenho eu tempo para isso. A minha Ermelinda não deixa passar pobre à porta, a quem não dê esmola; criança, que não afague; velho ou velha, que não corteje; reza todas as manhãs a oração que a mãe lhe ensinou, o Padre-Nosso e a Ave-Maria, onde se diz tudo o que se deve dizer a Deus; de dia trabalha, como filha de pobre que é, e mulher de casa que há-de ser... O Senhor me perdoe, se mais é preciso ainda, que mais não sei eu ensinar-lhe.

- Não tenha soberbas, compadre, não tenha soberbas! E cautela com o mimo que dá à pequena, que é o que perde muitas almas...

- Que mimo, que mimo? Logo eu com este génio de repentes é que hei-de dar mimo a esta pobre criança, que nem o da mãe conheceu!

- Ora diga, compadre: acha que é muito bem feito, da sua parte, deixar a rapariga com esses cabelos soltos? Não sabe que o demónio... cruzes! arma com eles laços às almas das criaturas?

- Fracas prisões são as do diabo, se as forja só de cabelos!... Então, por causa das tentações é que a comadre rapou os seus? Ah! ah! Tem coisas! É teima velha! Eu já lhe disse, comadre: Deus, que deu à pequena esses cabelos tão bonitos, é porque lhos quis dar. Se quiser, que lhos tire: eu é que não.

- Deus cerca-nos de tentações, para que nós as vençamos.

Forte tentação venceu a comadre! Aposto que os não cortaria assim, se os tivesse como os da minha Ermelinda, hem! Cortar os cabelos à minha filha, eu?! Fazer daquela cabeça de querubim uma dessas cabeças tosquiadas, que por aí andam!

- Talvez ainda se arrependa!

- Deixe lá, comadre.





Os capítulos deste livro