A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 1: I Pág. 14 / 508

- É um dos maiores amigos do pai da Morgadinha. Vê aquele muro acolá?

- Eu não vejo nada. Deixa-me!

- Pois pertence já à quinta dos Canaviais, que a Morgadinha...

- Outra vez! Cala-te para aí com essa Morgadinha - exclamou Henrique.

Era evidente enfim que estavam em pleno coração do povoado.

As casas apareciam mais juntas. De algumas saía um surdo rumor de vozes que tinha o que quer que era de lúgubre. Era a coroa rezada em família a Nossa Senhora. A voz grave do lavrador casava-se com a voz quebrada e trémula do avô, com a voz sonora e fresca da mãe, e a juvenil das raparigas e crianças naquele piedoso coro, produzindo um efeito que acabou por levar ao auge a impaciência do nosso esplenético viajante.

- Sumiu-se essa endiabrada quinta de Alvapenha, que não a acabamos de atingir? O almocreve desta vez nem respondeu; sacudiu uma chicotada sibilante junto às orelhas do muar, o qual com desusada rapidez galgou uma ladeira orlada de árvores, volveu à direita e, à voz do almocreve, estacou em frente de um portão de quinta resguardado por um telhado rústico.

- É aqui - disse o guia.

- Até que enfim! - exclamou Henrique, suspirando. Suspiro de conforto e de tristeza ao mesmo tempo, como o do homem cansado da vida, quando antevê o repouso do túmulo. Em Henrique era íntima a convicção de que a quinta de Alvapenha lhe havia de servir de cemitério.





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