E exclamava para dentro de uma casa térrea, escassamente alumiada por uma candeia:
- Boas noites, tia Escolástica. Como vai a pequenada?
- Ai, é vossemecê, Sr. José? Então não entra? - respondia-lhe uma voz feminina.
- Agora, não, amanhã.
E prosseguiu para Henrique:
- É uma santa criatura. A Morgadinha... Henrique interrompeu-o:
- Aonde fica, afinal, a quinta de Alvapenha? Onde mora minha tia? Não me dirás?
- É logo aí adiante, meu patrão. Em nós passando umas casas amarelas que há aí... é logo ao pé. Essas casas que digo são também da Morgadinha, mas há uma demanda pelos modos... O almocreve falava pela décima ou undécima vez na Morgadinha.
Até esta periódica referência a uma personagem que ele não conhecia impacientava Henrique de Souselas.
E continuavam a suceder-se em enredado dédalo as quelhas e azinhagas, a ponto de fazer perder toda a orientação. Umas vezes ouviam o ruído das levadas, que as últimas chuvas tinham engrossado; adiante, transpunham uma ponte rústica, escutando das profundezas do despenhadeiro, que ela atravessava, o fragor das cascatas nos açudes ou o ranger das rodas nos moinhos.
Henrique a cada momento imaginava cair num abismo.
- São os açudes do Casal - dizia o almocreve, berrando para se fazer ouvir através do estrondo da torrente. - Pertencem à Morgadinha dos Canaviais.
Henrique nem alento já tinha para falar.
Ao triste e quase sinistro aspecto daquela aldeia, tão cerrada lhe envolveu o coração a nuvem de melancolia, que cedeu sem resistência ao crescente torpor que o invadia, como o que desespera da vida e da salvação.
Mais adiante, excitou-lhe ainda as atenções uma toada plangente, melancólica, monótona, que exacerbou estes efeitos.
- É uma fiada em casa do Tapadas - disse o almocreve.