A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 11: XI Pág. 164 / 508

Para isso principiou por fazer alguns reparos na igreja paroquial, presenteou com vestidos novos todos os santos dos altares, e mandou renovar um sino, que havia doze anos tocava a rachado. Fez à sua custa a festa do orago, chegando a mandar vir fogo preso da cidade e um aeróstato, que ardeu a pouca altura do chão. Apesar, porém, de todos estes benefícios à localidade, o conselheiro Manuel Berardo, pai da Morgadinha, conquanto vivesse quase sempre em Lisboa, continuava a fazer-lhe sombra e a contrastar-lhe as ambiciosas vistas. Por isso, apesar da aparente amizade com que Seabra o acolhia e lisonjeava até, conservava por ele no fundo uma má vontade, um ciúme, de que eram de recear, tarde ou cedo, explosões.

Seabra era tão asseado, quanto o Sr. Joãozinho das Perdizes descurado no seu vestir. Usava sempre de suíça irrepreensivelmente talhada em volta do queixo; camisa muito lavada, peitos abertos e três grandes botões de brilhantes; no trajo combinavam- -se as variegadas cores de uma ave da América; e o ouro, distribuído com profusão por todos os acessórios da sua pessoa, atestava os bons resultados dos seus quarenta anos de Brasil. Passeava pela aldeia de chinelos de marroquim verde ou sapato de tapete, e era tal nele a delicadeza do andar, que voltava a casa sem que uma mancha enodoasse a alvura das suas meias de algodão fino. Aos domingos e dias de festa indignava a relva dos caminhos, calcando- -a com botas de polimento.

Além destes dois e do nosso conhecido Zé P’reira, que bebia, em silêncio, ao pé do taverneiro, havia um padre, coadjutor da freguesia, dois lavradores abastados e já de avançada idade, e outros que deixaremos confundidos na massa indistinta dos comparsas.

No momento em que entrámos, usava da palavra o Brasileiro, que estava sentado à porta da taverna, na mais limpa cadeira do estabelecimento.





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