A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 21: XXI Pág. 330 / 508

Inda quando um vencedor tem um papel providencial a cumprir, e o seu triunfo seja uma obra de redenção, o vencido, desde que cai, tem direito a um olhar compassivo, a uma lágrima de saudade. Não tenteis a louca empresa de aniquilar o sentimento, espíritos áridos que infundadamente o temeis, como coisa desconhecida à vossa alma seca e estéril. Quem deveras confia nos destinos da humanidade não tem medo das lágrimas. Pode-se triunfar com elas nos olhos.

Passado algum tempo, e quando já as sombras da noite se condensavam nos vales e subiam lentamente as encostas dos outeiros, o velho disse para Augusto:

- Agora que não tenho casa, dá-me por alguns dias o abrigo da tua.

- Por alguns dias? - repetiu Augusto, admirado. - Pois quer deixar-me depois?

- Quero. Vou com elas.

E apontou, ao dizer isto, para as árvores derrubadas.

Atravessaram a aldeia à hora a que vibravam nos ares os sons melancólicos da Ave-Maria.

Em silêncio chegaram a casa de Augusto, agora comum para os dois.

- Metes em tua casa um triste hóspede, pobre rapaz! - disse o ervanário, ao transpor o limiar. - Má companhia te fará a minha velhice.

Boa companhia me faz sempre a sua amizade, Tio Vicente. Nem a sua presença podia desalentar quem na mocidade é mais fraco e desalentado do que ninguém o pode ser na velhice.

- Custou-me muito este golpe de hoje! Não contava com ele! Desde ontem envelheci muitos anos. Podes crê-lo.

Quando Augusto ia a replicar, interrompeu-o uma voz que dizia de fora da porta:

- Dão licença?

E no limiar apareceu a figura do mestre Pertunhas, animada de cordeais sorrisos. O ervanário e Augusto não reprimiram um gesto de impaciência.

O homem entrou.

- Ora Deus seja aqui! Tão grande é o dia como a romaria, Sr.





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