A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 23: XXIII Pág. 365 / 508

- É um pouco sujeito a adormecer em si esse precioso sentido - replicou Augusto no mesmo tom. - Nem sempre são tão observadas pelo senhor essas delicadas abstenções, como agora. Sei-o por experiência.

- Não são, desde que os interessados me ordenam que intervenha, e desde que a minha intervenção pode ser útil a amigos.

- Pois bem; como, por qualquer dessas causas, se deu o facto em relação ao objecto que me traz aqui, espero que me explique a natureza da sua intervenção.

- Mas com que direito me vem o senhor pedir aqui explicações?

- Com o direito que me dá a consciência, senhor! - respondeu energicamente Augusto, despojando-se de toda a aparência de ironia - com o direito que tem todo o homem, caluniado cobarde e infamemente, como eu fui, de provocar uma acusação aberta e leal. Direito? É mais ainda do que direito; é dever. É um dever para com a moral, é um dever para com a consciência, é um dever para com a memória daqueles que nos transmitiram um nome honrado.

- Muito bem; mas, admitido que seja esse direito ou esse dever, e não lho contestarei, por que singularidade acontece que seja eu a pessoa que tem de responder por tudo isso? Por acaso será este o pretexto, para depois do qual tínhamos adiado uma entrevista que supusemos necessária?

- Se houve pretexto para ela, foi da sua parte, e escolheu-o bem infame e vil. Não lho invejo. Da minha não é pretexto; é uma interrogação bem positiva e terminante. Todos os motivos anteriores, que podiam autorizar-me a procurá-lo, cessaram ante a impreterível exigência deste. Preciso de justificar-me, e por isso preciso de conhecer e de ouvir os meus acusadores.

- E imagina que sou eu quem devo auxiliá-lo na tarefa? Pelo menos devia escolher uma hora mais cómoda. Sabe que na Alvapenha se janta patriarcalmente ao meio-dia.





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