A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 26: XXVI Pág. 399 / 508

Facto que destoasse dos monótonos hábitos do seu viver de muitos anos já a lançava em sérios embaraços. Ela própria confessava que inda havia pouco tempo principiara a afazer-se à estada de Henrique em Alvapenha, e a fazer o que era seu costume fazer antes de ele vir.

É, pois, evidente que D. Doroteia pouco mais podia fazer do que rezar, e para isso ninguém estava mais habilitado do que ela. Em relação à corte celestial era a boa senhora como estes almanaques vivos, que nos sabem dizer todos os canais por onde os diferentes negócios poderão ser melhor conduzidos nas cortes... terrestres... Conhecia a especialidade de cada santo e para cada um tinha uma fórmula de requerimento particular.

Cristina não a consentiu por muito tempo no quarto de Henrique, onde, com as melhores intenções, mais embaraçava o serviço do que auxiliava; usando de uma débil violência, foi-a levando para a sala do oratório, onde ela encetou uma reza sem fim.

Quando a Morgadinha chegou, ainda perturbada com as cenas do cemitério, e soube do sucedido na taberna, correu, assustada, para verificar a realidade do que lhe diziam.

Nos corredores encontrou um criado caminhando apressado num sentido, uma criada em sentido oposto, enquanto que, na sala próxima, D. Vitória tocava freneticamente a campainha a chamar por ambos.

Madalena dirigiu-se para lá.

Quando entrou, estava D. Vitória pronunciando uma daquelas intermináveis e arrevesadas objurgatórias, de que só a fecunda verbosidade feminina é capaz. Em geral as mulheres, seja dito antes em honra do que em censura do sexo, são oradoras de muito mais fôlego que os homens que blasonam de eloquentes. O assunto mais simples, uma colher que se perdeu, uma peça de louça que se quebrou, por exemplo, fornecem-lhes tema para uma prédica de duas horas.





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