A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 5: V Pág. 70 / 508

Reparemos, pois.

Cristina era mais bonita do que bela. Não havia naquele rosto uma só feição, que não fosse correcta e delicada. Tez alva e finíssima; olhos meigos e quebrando-se com suavidade infantil; boca, donde parecia sempre prestes a sair um afago ou uma consolação; voz, que, da muita piedade daquele bom coração, tirava, às vezes, modulações comoventes; numa palavra, uma figura de querubim, como as sonharam os mais inspirados artistas, cuja mão representou na tela os augustos mistérios do Cristianismo, tal era a primogénita de D. Vitória. Mas não procurassem nela alguns daqueles atractivos que fixam, de repente e como por magnético influxo, a atenção dos olhos, uma dessas particularidades fisionómicas pelas quais a Natureza, destruindo com arrojo feliz a geral harmonia de um semblante, consegue torná-lo mais fascinador; temperavam-se ali tão completamente todas as feições, que a atenção não se sentia obrigada a passar do conjunto delas, o que lhes diminuía muito a intensidade. É o grande senão dos rostos harmonicamente perfeitos.

Concordava-se em que Cristina era galante, ninguém lhe negaria simpatias; mas o pensamento na ausência dela, não se sentia dominado por a sua imagem: perdia-a até num vago, quando pretendia fixá-la; eram suaves de mais as inflexões daqueles contornos, brandas as tintas que lhe davam relevo, para que a memória conseguisse reproduzir facilmente o tipo angélico, de que lhe ficara uma agradável, mas vaga impressão.

Por um homem, em quem predominasse a razão, Cristina poderia vir a ser adorada; mas nas imaginações ardentes, nos corações inflamáveis, difícil lhe seria produzir alguma impressão duradoira.

Para bem se compreender a beleza de Cristina, era preciso sondar- lhe primeiro o coração,





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