A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 6: VI Pág. 93 / 508

De pequeno merecera àquele velho uma singular simpatia, e com afecto de pai fora sempre tratado por ele.

Resignou-se a aceitar sem reflexões; até porque sabia ser fácil o escandalizar o velho com elas. O que fazia era evitar, na presença dele, qualquer palavra que pudesse denunciar desejos de possuir um livro qualquer. Mas o velho, como se tivesse de facto algum poder oculto a informá-lo, às vezes parecia adivinhar; e trazia-lhe livros que Augusto deveras desejava, mas a respeito dos quais tinha a certeza de lhe não ter falado; nem eram daqueles que o velho conhecia.

A seu pesar, via-se quase inclinado a adoptar a crença supersticiosa do povo a respeito daquele seu velho amigo.

Pensando melhor, pareceu-lhe procederem de Ângelo as informações pelas quais o velho se guiava na escolha. Não lhe atribuía, porém, o presente, porque as economias de Ângelo não chegavam para tanto.

Depois de tudo quanto temos dito de Augusto, poderá ainda o leitor estranhar os ares pensativos com que o vemos? Poucos passos andados, depois que saiu do Mosteiro, encontrou Augusto a distribuidora das cartas, que lhe entregou uma, sobrescritada para ele. Era de Ângelo.

Augusto abriu-a imediatamente e leu-a ainda pelo caminho.

Era uma extensa carta, em que se sucediam os períodos em um desses longos, incoerentes e difusos arrazoados, que constituem a essência de uma carta de amigo para amigo.

Ângelo falava dos seus estudos, de saudades da terra, de esperanças e de projectos, projectos que, naquelas idades, nascem e morrem a todo o instante. Terminava esta carta, em que lhe participava a sua vinda à aldeia pelo Natal, com o seguinte período: «Peço-lhe que diga à Lindita que se não esqueça de mim. Dentro em poucos dias conto ir ver os coelhos do quintal dela, e ajudá-la a tirar água do poço.





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