As Aventuras de Tom Sawyer - Cap. 21: Capítulo 21 Pág. 106 / 174

Um dos traços principais destas composições era a tendência para a melancolia; outra era a propensão para amontoar palavras e frases empoladas, mesmo quando vinham pouco a propósito; e o que mais especialmente as marcava e prejudicava era a intolerável frase dogmática com que todas terminavam. Fosse qual fosse o assunto, fazia-se sempre um esforço para dar ao trabalho literário um aspecto que parecesse edificante quanto à moral religiosa. Apesar da falta de sinceridade destes finais, nunca se conseguiu abolir das escolas este uso, que tem prevalecido até aos nossos dias e prevalecerá talvez até ao fim do Mundo. Em todas as escolas da nossa terra as raparigas sentem-se obrigadas a terminar os seus exercícios de redacção com um dogma, e não é muito difícil averiguar que quanto mais frívola e menos religiosa é uma rapariga, mais longo e exageradamente piedoso é o sermão. Mas fiquemos por aqui. A verdade acerca dos nossos é sempre desagradável.

Voltemos aos, exames. O primeiro trabalho lido intitulava-se: «É Então Isto a Vida?» Talvez o leitor possa suportar um resumo:

«Com que deliciosa emoção os espíritos jovens gozam antecipadamente uma cena festiva nos trilhos vulgares da vida! Ocupa-se a imaginação a esboçar um quadro róseo de alegria. Em pensamento, a devota da moda vê-se voluptuosamente na confusão da festa "o ponto de mira de todos os olhares". A sua figura graciosa vestida de branco rodopia no labirinto das danças alegres. Tem o olhar brilhante e o passo leve no meio da reunião animada.

«Entregue a estes deliciosos pensamentos, o tempo voa e breve chega a hora encantadora em que há-de entrar naquele mundo paradisíaco que lhe inspirou os mais belos sonhos. Tudo aquilo parece um conto de fadas, do qual as cenas se vão sucedendo cada vez mais cheias de encanto. Porém, ao fim de pouco tempo, descobre que para lá daquela aparência sedutora tudo é vaidade: a lisonja que lhe deliciava a alma fere-lhe agora desagradavelmente o ouvido; o baile perdeu os seus encantos. Com a saúde arruinada e o coração amargurado, afasta-se então, persuadida de que os prazeres terrenos não bastam para satisfazer os anseias da alma!»

E assim por diante. Durante a leitura ouvia-se de vez em quando um murmúrio de aprovações, entre o qual se destacavam frases como estas: «Que lindo», «Que eloquente», «É bem verdade!», etc. E, cada vez que acabavam de ler um trabalho, os aplausos eram entusiásticos.





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