As Aventuras de Tom Sawyer - Cap. 4: Capítulo 4 Pág. 21 / 174

O director tinha um ar honesto, que correspondia exactamente à sua maneira de ser; era tão grande a sua reverência por coisas e lugares sagrados, separava-os tanto de tudo o mais, que, sem dar por isso, a sua voz na lição de doutrina tinha uma entoação muito especial, completamente diferente da dos dias de semana.

Começou assim:

- Meus filhos, quero-os todos sentados com o máximo juízo e que me dêem a mais completa atenção durante um minuto ou dois. Ora bem. É assim que devem fazer os bons rapazes e raparigas. Vejo uma menina que está a olhar para fora da janela, talvez julgando que eu ando por ali, possivelmente em cima das árvores, a fazer um discurso aos passarinhos. (Sufocados risos de aplauso.) Quero dizer-lhes quanto prazer me dá ver tantas crianças reunidas num lugar como este, para aprenderem a ser boas e justas.

E assim por aí fora. Não é necessário repetir todo o discurso, cujo modelo não varia e é, por conseguinte, conhecido de todos nós. A última terça parte perdeu o seu brilho devido a terem recomeçado as rixas e brincadeiras entre alguns dos rapazes maus, e ao sussurro e segredos que iam abrangendo tudo, chegando a abalar os mais firmes e incorruptíveis, como Sid e Mary. Mas, de súbito, todos os ruídos cessaram, deixando ouvir a voz de Mr. Walters, e o final do discurso foi escutado num silêncio recolhido.

Parte destes segredos tinham sido ocasionados por um acontecimento mais ou menos raro - a entrada de visitas. Era o advogado Thatcher acompanhado por um homem velho e alquebrado, um outro senhor de meia-idade, de cabelo grisalho e ar importante, e uma senhora muito distinta, que devia ser mulher dele. A senhora trazia uma criança pela mão. Tom tinha estado irrequieto e barulhento; mordia-lhe a consciência, e os seus olhos fugiram dos de Amy Lawrence, cujo olhar amoroso não podiam suportar. Mas, quando viu a pequena recém-chegada, a sua alma nadou em bem-aventurança. Momentos depois começou a exibir-se o mais que pôde, esmurrando os rapazes, puxando-lhes o cabelo, fazendo caretas, numa palavra, usando todas as artes que lhe pareciam capazes de fascinar uma rapariga e merecer o seu aplauso. Só uma coisa perturbava a sua alegria: lembrar-se da humilhação que sofrera no jardim daquele anjo, mas essa mesma ficou muito atenuada sob as ondas de felicidade que o inundavam. Deram o lugar de honra às visitas e, logo que acabou o seu discurso, Mr. Walters apresentou-as à escola.





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