As Aventuras de Tom Sawyer - Cap. 6: Capítulo 6 Pág. 32 / 174

No instante, o dente ficou pendurado no fio.

Todos os males têm as suas compensações, e, nesse dia, Tom foi invejado por todos os rapazes que o encontraram, porque o dente lhe facultava uma forma de cuspir muito engraçada e que idade, Juntaram-se todos à volta dele para assistirem à demonstração; um dos rapazes, que tinha um golpe num dedo e que fora centro de atracção e de homenagens até então, achava-se agora sem um único admirador e a sua glória pertencia ao passado. Ficou aborrecido e, com desdém que não sentia, disse não achar difícil cuspir como Tom Sawyer. Respondeu-lhe outro rapaz que tudo aquilo era pura inveja e o herói viu-se votado ao esquecimento.

Pouco depois, Tom encontrou o vadio da aldeia, Huckleberry Finn, filho do bêbedo da cidade. Huckleberry era cordialmente detestado e temido por todas as mães da aldeia, porque era preguiçoso, desobediente, ordinário e mau, mas principalmente porque todos os pequenos o admiravam, se deliciavam na sua companhia e tinham pena de se não atreverem a ser como ele. Tom, tal como os outros rapazes, invejava a vida desprezível de Huckleberry e tinha ordens restritas de não brincar com ele, por isso o fazia sempre que tinha ocasião. Huckleberry andava vestido com fatos de homem, já velhos e esfarrapados; trazia na cabeça um chapéu todo roto e a que faltava um grande bocado da aba; o casaco - quando o tinha - chegava-lhe quase aos calcanhares, e os botões de trás ficavam-lhe muito abaixo da cintura; os fundilhos das calças, por ficarem fora do lugar que lhes competia, pareciam um saco vazio, e as pernas das calças, se acaso se esquecia de as enrolar, arrastavam pela lama, feitas em franjas.

Huckleberry ia e vinha à vontade, quando estava bom tempo dormia nos degraus das portas e, quando estava húmido, dentro de alguma grande pipa desocupada; não tinha de ir à escola nem à igreja, nem receber ordens de ninguém; podia ir pescar ou nadar quando e onde lhe apetecesse, demorando-se até querer; levantava-se à hora que lhe apetecia; ninguém o proibia de jogar à pancada; era sempre o primeiro a andar descalço na Primavera, e, no Outono, o último a calçar-se; nunca tinha de se lavar nem de vestir roupa lavada; podia praguejar à vontade; numa palavra, tinha tudo aquilo que torna a vida preciosa! Assim pensavam todos os rapazes de S. Petersburgo, que tinham a quem obedecer.





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