A Morgadinha dos Canaviais - Cap. 13: XIII Pág. 197 / 508

Por isso na infância e nas idades viris é que melhor se apreciam essas fealdades, que escondem um coração angélico. A adolescência é impiamente cruel para com elas.

Por uma lei análoga é o povo, o símile da criança, porque não tem os sentidos educados para as mais subtis belezas da forma, e é o homem a quem ela já não fascina, embora ainda e sempre o deleite, como poderosíssimo elemento de beleza literária, - são estes os leitores que mais aptos estão para avaliarem uma ou outra inspiração que, entre muitos desvarios, tem a humilde musa que visita a cabana do lavrador ou a oficina do artista.

Apesar da defesa de Ermelinda, Ângelo não perdoou ao auto.

- Sabes que mais? Não decores isso - disse-lhe ele resolutamente.

- Meu pai quer.

- O que é que quer teu pai?

- Quer que eu entre no auto.

- E hás-de entrar. Quem te diz que não?

- E quer que seja a Fama.

- E hás-de ser a Fama.

- E não hei-de falar?

- Hás-de falar. Tinha que ver uma Fama que não falasse. Para que lhe serviriam as cem bocas?

- Então?

- Então, é que não é forçoso que digas o que aí está.

- E que hei-de eu dizer?

- Outra coisa.

Ermelinda olhava Ângelo, admirada, sem conseguir compreendê-lo.

- Outra coisa! - repetia ela, instintivamente.

- Olha - prosseguiu Ângelo. - Daqui até chegar o dia do auto vai muito tempo. Eu te darei outros versos para estudares, em lugar desses.

- E onde os tem?

- Eu os procurarei. Não digas tu nada. Basta que no dia recites, em vez desses, os que eu te der!...

- Mas que dirá meu pai e o Sr. Pertunhas?

- O mestre de latim? Pois que tem ele com o auto?

- É quem ensina como a gente há-de dizer.

- Ah! sim? Pois, para que ele nada diga, guarda para a ocasião os versos que eu te arranjar.





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