Ângelo fez a narração dos episódios da sua vida de colégio; das dificuldades e das belezas dos seus estudos naquele ano. Augusto, que da aldeia com ele os seguia, passo a passo, interrogava-o sobre algumas dúvidas que tinha, e esclarecia às vezes também, graças à sua poderosa penetração e natural lucidez, as que o ensino do colégio havia deixado no espírito do seu antigo discípulo.
A Geografia e a História, que eram as disciplinas estudadas naquele ano por Ângelo, deram assunto a grande parte deste diálogo.
Augusto inclinara-se aos estudos históricos, inclinação em que o ervanário o entretinha com frequentes presentes de livros daquele género.
Em exame de livros novos, referências a outros lidos, e leituras de alguns mais apreciados, passaram os dois grande parte da manhã, até que por fim Ângelo disse a Augusto:
- Ah! é verdade! Tenho um favor a pedir-lhe.
- Qual é?
- Sabe que está para breve o dia dos Reis?
- Sim.
- E portanto o auto com que o povo daqui o festeja; aquele auto em que Herodes faz tremer meio mundo?
- Bem sei - respondeu Augusto sorrindo.
- Este ano teremos a Linda a fazer de Fama. Fama bonita, por certo; mas se soubesse os versos que lhe deram para recitar! E Ângelo reproduziu, como pôde, as quadras do monólogo da Fama no auto dos Reis.
De quando em quando passava um sorriso pelos lábios de Augusto.
- Eu já conhecia isso. É o costume - disse ele por fim.
- Mas não lhe parece que de uma Fama como aquela se devia esperar melhor do que isto?
- E então o que quer que eu lhe faça?
- Outros para o lugar destes.
- Outros!... Eu?... - perguntou Augusto.
- Porque não?
- Que lembrança!
- Não me venha negar que os faz.
- Versos?
- Sim.
- Quer dizer que os leio.