Ângelo estava distraído deveras.
O velho voltou-se, de súbito, para este, perguntando-lhe:
- Tem ido ao mosteiro o hóspede de Alvapenha?
- Esteve lá ontem.
- É amigo das crianças?
- Parece-o.
- Conta muitas histórias às senhoras?
- Entretém-nas bastante.
- E ao... e a teu pai? Ouve-o com atenção?
- Conversaram muito toda a noite.
O ervanário parecia ligar grande valor a estas perguntas, porque, a cada resposta obtida, abanava pausadamente a cabeça com certo ar meditativo.
Augusto relanceava também para a fronte, meio contraída, do velho um olhar entre curioso e tímido.
O ervanário prosseguiu:
- Enfim... A desconfiança é um achaque de velhice, e nem sempre os mais felizes são os mais acautelados. Deus que vele, se os bons Lhe merecem ainda a graça da Sua protecção.
- O Tio Vicente desconfia do primo Henrique? - perguntou Ângelo, rindo.
- Primo?! - repetiu o velho, admirado.
- Primo lhe chamamos nós, porque a tia Vitória teima que, sendo ele sobrinho da tia Doroteia, é nosso primo também.
- Ah? Já aí vamos? E Lena?...
- Lena, Criste, todos lhe chamam por lá assim.
O ervanário pôs-se a murmurar algumas palavras ininteligíveis, terminando por estas:
- E, como no Egipto, é o vento sul que traz a praga dos gafanhotos.
Mas Deus que vele, Deus que vele. E eu não me demoro mais, que vou ainda daqui aos pardieiros de Cernuche.
- À caça dos sapos, Tio Vicente? - perguntou Ângelo, gracejando.
- Não, que não é agora o tempo - respondeu, sisudo, o velho.
- Dos sapos! Galante caça, na verdade! - continuou Ângelo no mesmo tom.
- Galante não será ela, pequeno - respondeu o velho - ; mas abençoada a chamarias se te torcesses no leito com as dores do carbúnculo, que não há remédio mais eficaz para o curar do que a pele destes animais seca ao ar livre.