Ângelo levantou-se então para brindar Augusto.
O conselheiro secundou-o, levando o copo aos lábios.
- Ah! o Sr. Augusto - disse Henrique, antes de beber e com certo tom de ironia. - Conheço: é uma ave rara destas imediações, que tem brios de cavaleiro errante sob umas aparências de filósofo.
- Brios de cavaleiro? - disse Ângelo, com vivacidade. - Inda isso não é tudo, Sr. Henrique; pode acrescentar: e alma de herói também.
- Pois dê-se-lhe também alma de herói, e, se for preciso, até consciência de santo. Vá à saúde da fénix! E bebeu.
Depois de pousar o copo, prosseguiu com o mesmo tom anterior:
- O que vejo é que é perigoso falar com a mais ligeira irreverência desta personagem; corre-se o risco de ver voltar contra o ímpio, que tanto ousa, os poderes conspirados do Céu e da Terra.
Bem; prometo acatar essa preciosidade.
- E creia - disse-lhe o conselheiro - que lhe é merecedor de toda a consideração. Augusto é um destes caracteres excepcionais que vivem à sombra de uma modéstia impenetrável e à sombra dela muitas vezes morrem. É necessário ter a vista muito exercitada nestas explorações de almas modestas, para descobrir uma assim.
- Felizmente para os míopes como eu - prosseguiu Henrique - elas fazem às vezes a fineza de se despojarem da sua timidez e de se mostrarem à luz. Não é verdade, prima Madalena?
- Que admira! - respondeu Madalena. - Bem oculto está o fogo na pederneira, primo Henrique, mas, percutindo-a, salta a faísca.
- Pobre rapaz! - notou a senhora de Alvapenha. - Aquilo nem parece deste tempo. O que eu não sei, primo Manuel, é por que ele se não resolveu a tomar ordens. Recusar o legado da D. Rosa!
- Não seja isso a dúvida. Ele sabe que, adoptando essa ou outra qualquer carreira, não lhe faltarão recursos para segui-la até o fim.